domingo, fevereiro 25, 2007 

MUDA-SE O PÚBLICO... (II)

As reacções dos leitores sobre as mudanças no jornal sucedem-se.

"Quando há mudanças é natural que surja alguma perturbação inicial. Leva algum tempo para substituir a estrutura do jornal memorizada pela nova.
Por enquanto, não me queixo a esse nível. Contudo, passei a ter de ler o jornal com uma lente, o que não acontecia até agora. Deixei de ter prazer na leitura do jornal e passei a confrontar-me com a ideia de velhice resultante da fadiga da leitura! Até o calvin diminuiu sensivelmente de tamanho! As tabelas tornaram-se quase ilegíveis. O novo formato das fotografias, nitidamente maior, não me compensa das perdas de qualidade na leitura. É um pouco estranho que quando a população idosa aumenta, se lhe dificulte a leitura...
Verifiquei também que o endereço e-mail do provedor deixou de ser indicado, tendo sido necessário passar pelo Google para o encontrar!", escreve José Hipólito dos Santos, um leitor de Oeiras.

o endereço electrónico do provedor do leitor do público é o seguinte: provedor@publico.pt

"De um leitor desde o número 1: Lá temos de gramar uma nova revolução gráfica, que eu aceito como um sacrifício que temos de suportar para os directores salvarem o jornal, nestes tempos de jornais gratuitos e internet. Mas há uma falha muito grande que tenho de protestar: o tamanho da letra e/ou a qualidade do papel ou outra coisa qualquer que não sei explicar, perturbam-me a leitura. Na semana passada até desisti de ler os artigos dos comentadores, por cansaço visual. E nunca até hoje tive problemas de visão, felizmente", escreve Manuel Lagido, um leitor de Vila do Conde.

Pedi um esclarecimento ao director.

"Efectivamente não reduzimos o tamanho da letra, mudámos foi o tipo de tipografia e esta é mais fina, menos densa, que a anterior. Inicialmente, quando vi as primeiras provas, pareceu-me bem. Quando fizemos os números de teste, impressos em papel de jornal, comecei a ter dúvidas. Coloquei a questão a várias pessoas, incluindo todos os membros do nosso Conselho Consultivo, porque eu vejo bem ao perto e não queria julgar sozinho. Todos, sem excepção, disseram que estava bem. Mas agora tenho vindo a receber cada vez mais queixas, pelo que já estamos a trabalhar para aumentar o corpo da letra", respondeu José Manuel Fernandes.

"Tenho, antes de mais, que aplaudir o novo grafismo. Está apelativo e, passada a fase inicial de estranheza, torna-se agradável. Há o problema do tamanho das imagens: excessivamente grandes e que convidam ao facilitismo nos textos, os quais se poderão tornar mais curtos e menos profundos. O tipo de letra, ainda que de fácil leitura, será talvez um tudo-nada diminuto. um ou dois pontos de aumento do mesmo fariam bem.
Relativamente às mudanças não visuais, há obviamente aspectos bons e maus. tendo apenas acesso ao Público on-line (de que sou assinante), não posso falar muito dos suplementos. ainda assim, fico com a sensação que o novo 'ípsilon' é bastante mais curto que o 'y'. Aí, das duas uma: ou o 'ípsilon' é realmente mais pequeno (e nesse caso temos a crítica a um suplemento tão fraco) ou então a edição on-line do mesmo está substancialmente reduzida face à edição em papel (de onde advém uma diferença de tratamento entre os clientes). Sendo o segundo caso aquele que se aplica (e há razões para acreditar nisso), convém explicar se isso é uma opção para se manter (de onde adviria uma falha perante os assinantes, não informados acerca da mudança) ou se é apenas um erro (e nesse caso há lugar a pedidos de desculpas e uma correcção rápida do problema). Tendo também o 'ípsilon' sido anunciado como um cruzamento entre o 'y' e o 'Mil Folhas', nota-se a falta de conteúdo de um e outro suplemento. Aqui, repito, poderá ser o problema da falta da edição on-line.
O segundo caderno, 'P2', está também interessante. Tem alguns temas de actualidade premente e assume uma vertente mais leve e lúdica, que motiva a leitura pelo prazer. Ainda assim, será, a espaços, excessivamente 'leve' de conteúdos, caindo em alguns facilitismos de escrita e de temas. Por outro lado, repete-se aqui uma crítica pessoal bastante antiga: a da falta de qualidade da secção de Ciência, desta vez agravada pela falta de conteúdo, o qual parece ter diminuído com a 'refundação'. Há que notar que ter uma secção de Ciência implica algo mais do que publicitar prémios de investigação científica ou anunciar as novas edições do Windows (algo que considero ridículo surgir na secção de Ciência, sendo mais lógico na economia ou sociedade). Implica antes falar de novos desenvolvimentos científicos e tecnológicos e apresentá-los numa linguagem acessível a leigos. Isso raramente tem sido feito (especialmente se comparada essa actividade com a das restantes secções do jornal), o que é inaceitável quando há centenas de publicações científicas mensais com dezenas de artigos disponíveis. Certamente que é possível ao Público encontrar mais informação para publicar.
Nota para os artigos de opinião: é pena que tenham sido 'atirados' para o fim do jornal. Uma marca distintiva do Público era o surgimento da opinião logo a seguir ao destaque. Dava peso à escrita dos seus autores e motivava o leitor a pensar no assunto. Assim, com os textos no fim, o leitor poderá descartar a opinião por puro cansaço ou desinteresse, visto que já terá lido o restante do jornal. Esta observação é, creio, tanto mais pertinente quanto os leitores que mais frequentemente lerão os artigos de opinião serão também aqueles que mais tendência terão a ler todo o jornal.
Última nota (e recorrente) para a edição on-line (paga). Com a mudança no site do publico.pt, surgiu um novo estilo de leitura bastante mais agradável, onde se pode ver toda a página como uma imagem. Isto acrescentou a possibilidade de ver as fotografias e outras imagens/gráficos, o que facilita imenso a compreensão de inúmeros artigos. Ainda assim, é pena que este sistema não tenha sido estendido aos suplementos, os quais continuam a surgir apenas em formato de texto (com a agravante de, agora, nem sequer ser possível ver as capas). com esta nova interface não há quaisquer razões para não incluir os suplementos no estilo de 'texto + imagens'.
A crítica também poderia ser levada ao suplemento 'inimigo público' (que creio continuar a ser publicado), o qual não era disponibilizado na edição on-line (segundo me foi explicado em tempos pelo director do publico.pt, José Vítor Malheiros) devido à profusão de imagens. Essa explicação já não colhe, portanto", escreve João Sousa André, um leitor de Enschede, Holanda.

Solicitei um esclarecimento a José Vítor Malheiros.

"A razão por que há suplementos que não estão disponíveis com o mesmo aspecto gráfico (e a mesma fiabilidade e funcionalidades) dos cadernos principais do Público não tem a ver com a quantidade de imagens desses suplementos (ter-me-ei certamente explicado mal ao leitor), mas com o facto de eles serem paginados num sistema diferente do resto do jornal - que não nos permite a mesma abordagem técnica de geração da versão on-line da edição impressa. Está prevista a integração dos suplementos no mesmo sistema, mas ela tem sido adiada. Não nos será possível apresentar os suplementos com o mesmo aspecto gráfico e as mesmas funcionalidades dos cadernos principais antes que essa integração tenha lugar. Escusado será dizer que desejamos essa integração, que ela está decidida e planeada e que ainda não aconteceu por manifesta impossibilidade física - que excede a capacidade de intervenção do subscritor desta resposta", respondeu o director executivo.

Na próxima crónica reproduzirei mais reacções.

domingo, fevereiro 18, 2007 

MUDA-SE O PÚBLICO...

O provedor do leitor tem por missão suscitar uma linha de esclarecimento e de diálogo pedagógico permanente, fazer do jornal uma obra aberta e interactiva entre quem o escreve e quem o lê.
É por isso que revelo, hoje, uma parte da profícua correspondência dos leitores sobre as mudanças do PÚBLICO.


"A nova remodelação gráfica do PÚBLICO resultou um aspecto, que a meu ver, me parece bastante negativo - o tamanho da fonte utilizada. Com o seu novo design não tenho dúvidas que o jornal ficou mais fácil de ver, embora tenha ficado com dúvidas se terá ficado mais fácil de ler. As fotos enormes que ilustram as notícias e as parangonas dos títulos tiveram como consequência a diminuição do tamanho da fonte usada, e a sua consequente legibilidade. Parece que o novo PÚBLICO não quer que os seus leitores percam tempo com aquilo que importa mesmo num jornal - as notícias", escreve Miguel Santos.

"Não resisti a escrever estas linhas após a nova imagem (e reestruturação, eliminação da XIS, etc. etc.).
Sou um assíduo leitor do PÚBLICO (já assinei a edição on-line), uma longa relação desde a edição número um. Devo dizer que me lembro quando apareceu, do seu grafismo 'limpo', sóbrio q.b., minimalista, que resistiu até aos dias de hoje. 'Em fórmula ganhadora não se mexe.' Quem não se lembra do pequeno quadrado colorido da Apple ao lado do logo PÚBLICO?
Durante vários meses até a 'maçã' compunha esta imagem de equilíbrio. E aqui está o cerne.
Hoje estava curioso da nova imagem. Não queria perceber através da publicidade do próprio jornal aquele 'P' ostensivo e de cor 'desmaiada' fosse o grafismo final. Enganei-me.
Afinal é verdade, o PÚBLICO está mais 'P' e menos Jornal. Passo a explicar:
O 'P', que tipo de fonte é esta? Parece-me um vulgar 'Times New Roman', pouco estilizado e de uma cor indescritível. Mas a transformação não se fica pela capa. Páginas infinitas de cor (pretendem combater os offsets das revistas? Os catálogos do LIDL?, mal impressas, mal equalizadas. Meus Senhores, um jornal não é uma revista! (refiro edição papel sem incluir os suplementos).
As notícias... passaram a 'breves'. Que temos aqui? Um piscar de olhos ao 24 Horas? Ao Correio da Manhã? Para final a cereja no bolo, 'cadê' a tira fantástica do Calvin & Hobes? Gritei para dentro do Jornal... mas nem sinal do 'tigre'. Ah! Lá está no final em rodapé, da última página, quase a 'cair' do Jornal.
Compreendo que não é fácil inovar, mas assim? Desta forma? Em 2006 enterrámos um 'Independente'. Espero que não seja o princípio do fim.
Apesar de tudo desejo sucesso, faço votos que encontrem de novo o equilíbrio. Vocês são a referência do Jornalismo escrito
", escreve André Rebelo.

Pedi explicações a José Manuel Fernandes.

"O grafismo foi alterado em 2000 e suscitou na época muito mais polémica. Sobre o novo logótipo, junto envio texto em que se explica a sua lógica. Sobre os conteúdos, a opção foi desenvolver mais os temas mais importantes ou mais inovadores e ser mais breve nos outros. Exemplo: na edição pós-referendo não demos o que todos deram: os líderes a votar. Optámos antes por acompanhar um padre e um médico que realizava já abortos. Fugir do comum e já conhecido, acrescentar novidade e análise. Ir melhorando a fórmula todos os dias. Isto está muito longe do modelo Lidl", explica o director.

As opiniões dos leitores não são coincidentes.

"Parabéns ao PÚBLICO pelo seu novo design, & Congratulations to the designer Mark Porter por acertar a engenharia da leitura, em reduzir as 6 colunas estreitas para 5 colunas maiores (melhor para o Português - e os Portugueses), libertando assim o PÚBLICO de um colete-de-forças tipográfico para um público mais alargado.
E o 'P' do logo (que remete para os escantilhões do Amadeo) é muito mais versátil... Bravo! Fique registado, salvo o registo
", escreve Robin Fior ("PhD in Tipography & Graphic Communication").

"Verifiquei que o que mudou na generalidade me desagrada. O que é mais notório é o grafismo, desadequado, e fora do espírito do tempo. A meu ver é um retrocesso e uma aproximação ao que os jornais concorrentes têm de mau e que o PÚBLICO até ontem tinha de bom. O que tinha era uma disposição das notícias diferente, fácil de ler, organizada. O jornal de hoje é mais igual aos outros. A arrumação dos conteúdos também me pareceu menos lógica e algo confusa. A introdução de cor, à partida parece ser positivo, mas a meu ver também não é. É uma cedência à imagem em detrimento do conteúdo (imagens muito grandes) que fica esmagado pela imagem e desvia a atenção da leitura.
O PÚBLICO parece estar a tornar-se mais um jornal para folhear e menos um jornal para ler.
Em todo o caso estas são as minhas primeiras impressões e admito que possa estar a ser injusto. Irei aguardar pelos próximos dias para melhor avaliar a mudança e nessa altura irei sentir-me à vontade para lhe escrever novamente, para confirmar ou não a minha primeira impressão
", escreve João Sobral, um leitor de Grândola.

"Quero felicitar a equipa editorial pela atitude demonstrada em melhorar o PÚBLICO, tornando-o mais alegre.
Mas é evidente que essa reforma não deveria passar pelo sacrifício da Secção Economia onde, por exemplo, as cotações diárias dos fundos de investimento, PPR, etc. foram suprimidas. Essa era uma das mais-valias para mim
", escreve Manuel Augusto Lopes.

Solicitei mais um esclarecimento ao director.

"A opção de retirar essa informação do papel seguiu uma linha mais prudente que a de outros jornais, como o New York Times (NYT) e Wall Street Journal (WSJ). Deixámos os principais indicadores, retirámos os que interessam sobretudo aos profissionais, que tendem a consultá-los on-line. O NYT e o WSJ retiraram tudo mas depois reintroduziram parte. Nós só retirámos parte. Em contrapartida, criámos uma página de Economia no nosso site com muito mais informação do que antes", responde José Manuel Fernandes.

Na próxima semana reproduzirei mais reacções dos leitores e as respostas de José Manuel Fernandes.

domingo, fevereiro 11, 2007 

ERRATUM

O Procurador-geral adjunto junto do Supremo Tribunal de Justiça, António Bernardo Colaço, escreveu ao provedor.

Venho por este meio pôr à consideração de V. Ex.ª o seguinte: Na sua edição de 03.02.2007 o ‘PÚBLICO’ inseriu na página 10, a notícia intitulada ‘Procurador no S.T.J. critica Pinto Monteiro’. Pese embora o conteúdo da notícia reproduzisse com fidelidade a minha intervenção no VII Congresso do M.P. realizado no Alvor nos dias 1,2, e 3 de Fevereiro, a verdade é que em momento algum desta intervenção fiz referência à pessoa do Dr. Pinto Monteiro, actual Procurador Geral da República (PGR), que assumiu funções há pouco mais de dois meses. A haver crítica no meu trabalho ela referia-se, isso sim, à orgânica da Procuradoria-Geral da República, que datando pelo menos desde 1978, não pode de forma alguma ser atribuída ao actual PGR.
Dada a incompatibilidade do título com a notícia, dirigi-me por e-mail logo no dia 04.de Fevereiro à Sra. Jornalista responsável pela notícia bem como ao Sr. Director do ‘PÚBLICO’ e posteriormente a V. Ex.ª para que se procedesse à rectificação do título, nomeadamente eliminando a referência a
‘Pinto Monteiro’.
O ‘PÚBLICO’ na sua edição de hoje (07 de Fevereiro) limitou-se a publicar sob o título vago e amorfo de ‘Rectificação’ em jeito de Carta ao Director (página 4) o texto do meu e-mail inicial, sem qualquer comentário, ou explicação e, o que é mais grave ainda e de lamentar, ficando sem resposta a tão solicitada rectificação do título.
Deixo ao superior critério de V. Ex.ª a apreciação quanto ao modo de actuação do periódico em questão, sempre confiante no prestígio que o ‘PÚBLICO’ merece na valoração jornalística eticamente aferida.
A V. Ex.ª fica o preito da minha homenagem pela forma dignificada com que me atendeu
”, escreve o Procurador-geral adjunto junto do Supremo Tribunal de Justiça.

Solicitei um esclarecimento à jornalista Paula Torres de Carvalho, autora da notícia.


“O Dr. Bernardo Colaço tem toda a razão. No lugar dele, também ficaria aborrecida. O título inicial da notícia (que ele próprio reconhece ser rigorosa) não era o que saiu. Foi alterado pelo responsável da edição (prática que, aliás, está prevista no Livro de Estilo do Público) provavelmente por estar longo demais. A ideia de Procuradoria-Geral foi automaticamente associada a ‘Pinto Monteiro’, o que obviamente está errado mas que não creio ter sido intencional. Quando dei por isso, no dia seguinte, ao comprar o jornal (era sábado) tive imediatamente a noção que o erro era particularmente desagradável para o referido magistrado e comuniquei-lhe, telefonicamente, que corrigiria o erro na segunda-feira quando chegasse ao jornal, o que fiz com a imediata concordância do director. A carta do Dr. Bernardo Colaço acabou por ser apenas publicada na quarta-feira mas, nessa altura, já com todos os esclarecimentos e pedidos de desculpa previamente transmitidos.
Em suma: Houve, de facto, uma utilização abusiva do nome do Procurador-Geral da República no título da notícia, quando o seu conteúdo a ele não se referia. O erro foi detectado, reconhecido, inclusivamente junto das pessoas envolvidas. Finalmente o jornal publicou, na íntegra a carta que o Dr. Bernardo Colaço enviou ao director do jornal”, respondeu a jornalista Paula Torres de Carvalho.

Em momento algum da sua intervenção o Dr. António Bernardo Colaço se referiu, portanto, à pessoa ou à acção do actual Procurador-Geral da República (ao contrário do que diz o título do PÚBLICO).
A alteração do referido título (considerado demasiado longo) deturpou a realidade dos factos. O erro não terá sido intencional, mas não deixa de ser um erro.
O Livro de Estilo estipula que, “
em caso de erro, o jornal retractar-se-á imediatamente com o destaque e a justificação proporcionais à informação original. Qualquer imprecisão deverá ser prontamente corrigida. Com a periodicidade adequada, O PÚBLICO Errou trará a correcção dos erros ou das imprecisões que tenha impresso nas suas páginas em edições anteriores. Estatísticas erradas, nomes mal grafados, funções incorrectamente referidas, faltas de rigor e objectividade, informações falsas, declarações indevidamente atribuídas, são corrigidas por iniciativa própria do jornal.”

O PÚBLICO limitou-se a publicar, passados quatro dias, na secção
“Cartas ao Director” uma mensagem do Procurador-geral adjunto no Supremo Tribunal de Justiça.
Se uma rectificação raramente tem a força (o destaque e o espaço) da notícia que a originou, uma
“Carta ao Director” não significa o reconhecimento de coisa alguma.
Eis as conclusões do provedor:


1- A ‘Rectificação’ devia ter sido formulada pelo próprio PÚBLICO logo a seguir à publicação do erro;

2- A “
Carta ao Director” do Dr. António Bernardo Colaço devia ter sido acompanhada de uma nota da Redacção (sugerida, designadamente, pelo provedor) na página de abertura da secção Nacional, espaço onde a notícia foi publicada.

O provedor apurou, entretanto, que a nota da Redacção não foi publicada por causa de um “lapso”. Temos, portanto, um erro associado a um lapso. É lamentável. O PÚBLICO errou, duplamente.

Os jornais que recusam reconhecer os seus erros acabarão, irremediavelmente, por hipotecar a pouca credibilidade que ainda lhes resta. Porque não tenhamos dúvidas: a amnésia, as desculpas sinuosas e, em desespero de causa, a falta de transparência nunca foram solução para nada.
A primeira obrigação da Imprensa é a procura da verdade, reportando-a rapidamente com factos, rigor, contexto e um tratamento equilibrado. É uma responsabilidade enorme, mas é o preço da nossa credibilidade, questionada inexoravelmente edição após edição. Nos dias que correm é importante repeti-lo.

domingo, fevereiro 04, 2007 

O OITO E O OITENTA

"Leitor do PÚBLICO todos os dias, desde o primeiro dia, custa-me vê-lo resvalar, por vezes, cada vez mais vezes, para o mau jornalismo.

Dois exemplos à consideração do Provedor:
1º exemplo.
Violador de menino deficiente condenado a 12 anos de prisão’ (14/12/2006, p. 21, José Bento Amaro). Li a última parte do artigo (‘Elogios e suspeitas’) com crescente perplexidade. Já a anterior (‘Feios, porcos e maus’) parecia mais um recorte literário do jornal O Crime que do PÚBLICO, mas aqui faz-se do jornalismo uma aberração: sobre a mãe da vítima (o pequeno Daniel), ilibada das acusações de que era alvo, o jornalista (?) perora:a miséria aludida não se fica, no entanto, pelo agregado familiar de Fábio (o condenado). Mónica tinha dois filhos de pais diferentes, sendo que nenhum deles era o agora condenado.’
E prossegue na descrição da ‘miséria’:supostamente sabia dos abusos, mas calara-se porque não queria perder o namorado (a miséria de que foi ilibada)com quem praticava sexo "várias vezes ao dia"’ (só um invejoso pode apelidar isto de ‘miséria’)nas modalidades de vaginal, oral e anal(nada intrusivo na vida da mulher a quem mataram o filho, nada moralista) e continua achandoainda de referir’, como se já não bastasse,que, quando do orgasmo’ – que miséria, até orgasmos tinha – ‘ela arranhava-lhe as costas e ele mordia-a’.

2º exemplo. Leio o título:Portugueses têm mais filhos fora do casamento do que os espanhóis’ (21/12/2006, p. 19. Catarina Gomes).
Interessado leio o destaque:Na área da igualdade de género Portugal apresenta sinais de progresso que o colocam à frente do país vizinho (...)’.
Como o temaigualdade de géneroé um dos meus divertimentos favoritos fui ver, já antecipando uma gargalhada, quais os taissinais de progresso’, que nos põem na vanguarda peninsular. E ei-los explicados ao povo com a ajuda da académica Karin Wall, socióloga da família’:

1. Os portugueses casam-se cada vez menos. Os espanhóis mantêm-se estáveis.
2. Em Portugal, o crescimento das uniões de facto parece maior que em Espanha
em convergência com o resto da Europa’, rejubila a socióloga.
3. A taxa de participação feminina no mercado de trabalho é muito superior em Portugal.
4. No ensino superior, em Portugal, a proporção de mulheres é de 66% e em Espanha é (só) de 58%.
5. Os espanhóis só nos ganham por já terem o casamento homossexual, no resto são mais conservadores.
Ora, com é óbvio, os pontos 1, 2 e 4 nada adiantam ou atrasam em relação a qualquer, supostamente benévola e desejável,
‘igualdade de género’. Que apareçam sociólogas da família a regozijar-se com o decréscimo dos casamentos e o aumento dos divórcios e uniões de facto é, do ponto de vista científico, muito suspeito. Que a jornalista não pergunte como é que o facto de haver o dobro de mulheres a estudar na universidade é sinal de progresso naigualdadeentre homens e mulheres, é espantoso. Será que já ninguém se espanta com estas coisas?", escreve Alberto Magalhães, um leitor de Nossa Senhora de Machede.

Os reparos são pertinentes apesar de o provedor não reconhecer ao leitor as competências legais para determinar quem é ou não jornalista.

O artigo ‘Violador de menino deficiente condenado a 12 anos de prisão’ é controverso.
O provedor solicitou, portanto, esclarecimentos ao jornalista José Bento Amaro.

"As alusões feitas pelo leitor estão fora de contexto. Porquê? Porque estão seccionadas. O leitor pega em algumas passagens da notícia e junta-as como se elas assim tivessem sido publicadas.
Nenhuma das passagens da notícia resulta da imaginação do jornalista. Antes são resultado do acórdão proferido em tribunal e, também, expressões utilizadas pela juíza que presidiu ao julgamento.

O leitor entende que há passagens na notícia que não deveriam ser citadas. Pois bem: acompanhei quase todas as audiências do julgamento (falhei uma). Apesar de ter em minha posse (como todos os restantes jornalistas) a acusação, nunca antes da data da sentença a reproduzi. Só o fiz após ter sido ditada a sentença porque entendi, e continuo a entender, que essas mesmas frases eram essenciais no processo para sustentar uma das partes da acusação (relativa à mãe). Os restantes jornais, só a título de exemplo, usaram o teor da acusação logo após a primeira audiência.

Ainda assim, antes de escrever a notícia tal como a mesma veio a ser publicada, tive o cuidado de falar com o meu editor acerca do conteúdo da mesma. Ambos concluímos que havia matéria, por chocante que possa parecer, que deveria ser relatada para que, desse modo, os leitores pudessem ter uma mais profunda percepção e conhecimento da acusação e do caso em julgamento.

Devo, enquanto jornalista, questionar o veredicto do tribunal (este caso teve jurados)? Admito que, em algumas situações (que não esta) o possa fazer. Sei, e isso com toda a certeza, que o meu principal dever enquanto jornalista é informar. E se tiver que relatar alguns pormenores mais sensíveis, desde que tal sirva para ajudar os leitores a compreender o porquê de determinadas acusações, então fá-lo-ei.

Houve um leitor que ficou chocado com algumas passagens do texto final? Aceito. Mas também tive outro tipo de reacções, de outros leitores e colegas de trabalho, que reconhecendo a dureza das palavras, acabaram por concordar que as mesmas eram justificadas, uma vez que resultam da sentença proferida pelos jurados e lida por uma magistrada."

O problema é o jornalista ter confundido informação e opinião e descrito exaustivamente pormenores da vida íntima que não são, de todo, indispensáveis para a boa compreensão da notícia.
A juíza tem de fundamentar as razões da sentença até ao ínfimo pormenor. Assim manda o Direito.
Ao jornalista compete transmitir os factos essenciais para a boa compreensão do acontecimento, sem ferir desnecessariamente a sensibilidade dos leitores. A isso o obriga o Jornalismo. E o próprio Livro de Estilo do PÚBLICO.
José Bento Amaro descreveu a vida íntima de cidadãos publicamente identificados com uma minúcia obscena e opinou sobre a suposta miséria social do casal, o que é uma conclusão da sua lavra.
É o "rigor" elevado a 80.


O segundo artigo é igualmente polémico, mas a contrario sensu. Contém erros e imprecisões, quando a base do texto é um relatório do INE.

Eis alguns exemplos:

ERRO:
"Só 11% das pessoas empregadas em Portugal têm uma licenciatura".
O INE menciona 13% (11% são os patrões). Se as percentagens são importantes, o erro, aqui, é de 15,3%...

ERRO: "Um português pode contar em média com 75 anos de vida, menos três anos do que um espanhol".
Segundo o INE, a esperança de vida à nascença para um homem é de 74,9 anos e para uma mulher 81,4 anos, em Portugal.

Eis a resposta da jornalista: "Quando escrevo no meu artigo que ‘na igualdade de género Portugal apresenta sinais de progresso que o colocam à frente’ antecipo os dados numéricos e afirmações que são referidos nos parágrafos seguintes do meu texto. Refiro-me a indicadores respeitantes à taxa de participação feminina no mercado de trabalho, que é muito superior em Portugal do que em Espanha (e cuja média não é referida porque o relatório permite perceber as diferenças mas centra-se nas comparações regionais), e que no ensino superior, em Portugal, a proporção de mulheres é de 66% e em Espanha é de 58%. O aumento da proporção de mulheres no ensino superior é um inequívoco sinal de progresso nesta área, ainda mais se recuarmos, por exemplo, aos números de 1960: 29 por cento de mulheres matriculadas no ensino superior (António Barreto, A Situação Social em Portugal).

Antes de mais noto que o leitor diz jocosamente ter o tema da igualdade de género como ‘um dos meus divertimentos favoritos’, o que revela que não o reputa como sério. Compreendo que o facto de os portugueses se casarem menos do que os espanhóis e de as uniões de facto terem crescido até possa ser questionado como indicador de igualdade de género. Mas estas afirmações, que são devidamente atribuídas à socióloga Karin Wall, uma das mais eminentes cientistas sociais em Portugal na área da família, são da sua responsabilidade e são de teor científico.
Tive o cuidado do voltar a falar com a socióloga a este propósito depois da recepção da crítica. A socióloga Karin Wall explicita que o juízo nada tem de ideológico, é uma afirmação científica. Passou-se de um Portugal em que ‘o casamento pela Igreja era o modelo único de família’, e o papel social da mulher quase restrito ao de dona de casa, para um contexto que dá à mulher ‘maiores oportunidades de organização conjugal’, mais flexibilidade e hipóteses de escolha. Também a legalização das uniões gay é vista como ‘um sinal de progresso porque é sintoma de orientações sexuais mais diversas e de práticas menos discriminatórias’. "A diversificação da família tem promovido a igualdade nas mulheres", remata a especialista.

Em momento algum se refere que ‘o aumento dos divórcios’ é um sinal de progresso na igualdade de género, como menciona o leitor. A socióloga refere a alteração da lei do divórcio a seguir ao 25 de Abril, considerada um progresso na igualdade de género porque passou a permitir o divórcio por mútuo consentimento aos casados pela Igreja, algo não permitido na ditadura.

O leitor refere que existe "o dobro de mulheres a estudar na universidade", a afirmação é incorrecta e não consta do texto, a taxa de participação feminina em Portugal na universidade é de 66 por cento (face a 58 por cento em Espanha). Reafirmo que é um sinal de progresso, face a um atraso de décadas em que as mulheres estiveram quase arredadas do meio universitário. É também sabido que o peso feminino na população universitária é ‘um sinal de progresso’ que não se repercute na ocupação feminina igualitária de lugares de chefia em termos políticos e empresariais.

Em resumo, as críticas do leitor não são feitas em tom sério e não são sequer rigorosas contendo as duas incorrecções que referi.

O Provedor pergunta: ‘Como explica a sucessão de erros? (vários números errados, comparação entre dados diferentes, arredondamentos nuns casos e noutros não, omissões, etc.).

Quanto à questão dos ‘arredondamentos nuns casos e noutros não’: todos os números do texto
principal foram arredondados por uma questão de legibilidade do texto, que ficaria sobrecarregado de vírgulas e mais vírgulas sem ganhos de compreensão (na caixa de números não se fez o arredondamentos porque em termos gráficos a informação fica clara sem a mesma sobrecarga).

No texto houve uma única excepção a esta regra do arredondamento, porque isso esbateria uma diferença que é ténue mas existe: entre 4,7 casamentos por mil habitantes em Portugal e 5,1 em Espanha. Se fossem arredondados ambos seriam lidos como cinco por mil habitantes.
Quanto aos erros que refere o Sr. Provedor, é importante dizer nenhum deles altera as premissas do texto: que a esperança de vida é menor em Portugal do que em Espanha, que o número de doutorados é maior em Portugal do que em Espanha e que o número de pessoas empregadas com licenciatura é mais baixo em Espanha do quem Portugal.

Dito isto, reconheço um erro numérico que depois implicou lapso em duas referências: de facto 74,9 anos é a esperança de vida dos homens portugueses e não dos portugueses em geral (que é de 78, média dos homens (74,9) e das mulheres (81,4)). Portanto, a diferença de esperança de vida em relação aos espanhóis – que está correcta é a média de homens (76,7) e mulheres (83,2) e é de 80 anos – não é de três anos mas de dois.

No gráfico vem erradamente referido o número de doutorados por mil habitantes e o correcto seria dizer por cem mil habitantes.

E por fim, não são 11 por cento ‘as pessoas empregadas em Portugal’ com licenciatura mas 12 por cento – se somarmos empregados (13 por cento) e patrões (11 por cento) que também são trabalhadores) e fizermos a média – ou 13 por cento se forem tidos em conta apenas os patrões. O lapso deveu-se a um erro de leitura entre colunas. As minhas desculpas aos leitores".

As explicações são parcialmente aceitáveis. Num artigo (baseado em estatísticas) em que o rigor e os pormenores são essenciais Catarina Gomes apresenta várias percentagens erradas, dados incompletos e emite opiniões (que não são produzidas pela entrevistada). Por outro lado, a jornalista comete erros crassos no plano científico: calcula a esperança de vida de "um português" adicionando o valor da esperança de vida dos homens ao das mulheres e dividindo o resultado obtido por dois.
"Não é correcto do ponto de vista metodológico. O cálculo das esperanças médias de vida decorre da aplicação das funções das tábuas de mortalidade, calculadas para o conjunto da população (homens e mulheres) e para ‘sexos’ em separado", disse ao provedor fonte do INE.
A comparação com a esperança de vida de
"um espanhol" também é, por essa mesma razão, incorrecta.

O provedor considera, por outro lado, que os conceitos de Progresso são discutíveis.


66% de mulheres na universidade é um sinal de progresso?
Os casamentos homossexuais são um sinal de progresso?
A diminuição dos casamentos é um sinal de progresso?
O aumento do número de filhos nascidos fora do casamento é um sinal de progresso?
O que é o Progresso? E de acordo com estes critérios onde se situaria o Progresso absoluto?
A única constatação a que o provedor chega é que a instituição Família está a sofrer uma profunda mutação.

O provedor duvida também do carácter científico da seguinte afirmação:
"A legalização das uniões gay é vista como ‘um sinal de progresso porque é sintoma de orientações sexuais mais diversas e de práticas menos discriminatórias’."
É uma afirmação tanto mais polémica quanto não está no artigo. Foi "rematada" a posteriori pela socióloga (como reconhece a própria jornalista). É, portanto, uma opinião, discutível por definição. E o provedor recusa peremptoriamente juízos de valor de natureza social travestidos de informação. A jornalista tornou sua a tese da socióloga e promove a opinião dela (sobre a matéria) a facto indiscutível.

No primeiro artigo o "rigor" foi elevado a 80; neste fica-se pelos 8.
Seriam dois casos de somenos importância se não ilustrassem a actual tendência dos jornalistas para o "facilitismo".

Sobre o blog

  • O blogue do Provedor do Leitor do PÚBLICO foi criado para facilitar a expressão dos sentimentos e das opiniões dos leitores sobre o PÚBLICO e para alargar as formas de contacto com o Provedor.

    Este blogue não pretende substituir as cartas e os e-mails que constituem a base do trabalho do Provedor e que permitem um contacto mais pessoal, mas sim constituir um espaço de debate, aberto aos leitores. À Direcção do PÚBLICO e aos seus jornalistas em torno das questões levantadas pelo Provedor.

    Serão, aqui, publicados semanalmente os textos do Provedor do Leitor do PÚBLICO e espera-se que eles suscitem reacções. O Provedor não se pode comprometer a responder a todos os comentários nem a arbitrar todas as discussões que aqui tiverem lugar. Mas ele seguirá atentamente tudo o que for aqui publicado.

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