domingo, maio 27, 2007 

P COMO PUBLICIDADE

Um anúncio “especial” suscitou alguns protestos.

“O que se passa com o PÚBLICO? Para além dos erros de ortografia, sintaxe e imprecisões nas notícias (que ocorrem com demasiada frequência) conseguiram sobrepor publicidade às notícias: colaram um 'post-it' de publicidade a uma empresa em pleno texto de uma notícia na 1ª página (5 de Maio)”, escreve Maria Amélia Figueiredo Dias.

“Quando adquiri o PÚBLICO no meu fornecedor habitual, verifiquei que na página frontal havia um papel branco colado. Admiti que tal era devido à incúria do dono do quiosque. Interrogado este, mostrou-me que todos os exemplares do PÚBLICO estavam nas mesmas condições.
Procurei retirá-lo com todo o cuidado para não prejudicar a integridade do texto por baixo. Não fui bem sucedido.
Protesto energicamente contra esta manifestação de arranjar receita por qualquer preço, neste caso, a expensas dos leitores que tendo pago o jornal para poderem ler TUDO O QUE LÁ ESTÁ se vêem impedidos, parcialmente, devido a esta iniciativa.
Onde anda a ética do PÚBLICO? Qual a sua razão moral para fazer as denúncias que tem trazido ao conhecimento dos leitores ultimamente?”, escreve Manuel Joaquim Poças.

“Foi com espanto que hoje, chegado a casa, tirei de um saco de plástico o ‘PÚBLICO’ e vejo colado na primeira página um papel branco 7x7 com os dizeres ‘Consulting by Deloitte’ e depois, com letras mais pequenas, ‘Deloitte Consultores, S.A.’.
O famigerado papel branco estava (está, porque não consigo tirá-lo sem rasgar o jornal) a meio caminho entre o título principal do jornal e a fotografia que ilustra as eleições francesas.
Não sou contra a publicidade nos jornais – ajuda à sua imprescindível sustentabilidade – mas, com franqueza, há publicidade e há publicidade.
Não me parece que um jornal da estirpe do ‘PÚBLICO’ seja o melhor receptáculo para este tipo estúpido de publicidade, invasor dos mais elementares direitos do leitor e que, neste caso, se resumem, muito simplesmente, à básica leitura da primeira página do jornal. Para isso, desembolsei 1,25 € (mais 3,90 €, porque também comprei o disco).
Só tive pena de ter verificado esta ofensa horas depois de ter adquirido o jornal. A alternativa seria então a sua devolução imediata e a compra de um outro”, escreve Luís Pinheiro de Almeida.

“Parece inverosímel mas é verdade: a edição do jornal ‘PÚBLICO’, trazia na 1ª página um auto-colante de publicidade ‘Consulting by Deloitte’, colado exactamente sobre a notícia ‘Operação Furacão apanha Licínio Bastos’.
Já é mau pormos um auto-colante na 1ª página do jornal, mas em cima de uma notícia é péssimo. Efectivamente não encontraram outro espaço. Poderiam ter colado sobre o logotipo do jornal, p. exemplo, afectava menos os leitores.
Eu compreendo a necessidade de gerar receitas mas não a qualquer preço, isto é, com prejuízo dos leitores de um jornal que eles pagam”, escreve António Sales.

“Essa de colar um papel com publicidade a uma tal ‘Deloitte’ (que certamente pagou bem) é ideia peregrina e que julgava incompatível com um jornal como o PÚBLICO, pelo menos nos termos em que foi feita.
O dito papel, colado sobre grande parte do texto de uma das notícias de 1ª página (‘Financiava PS...’), sem a elegância de um ‘post it’ (que descola suavemente, sem deixar marcas e sem rasgar o papel do jornal), impossibilitou-me de ler o referido texto.
É certamente uma insignificância. Apesar disso, questiono-me se para o PÚBLICO é mais importante a notícia que publica e a efectiva leitura da mesma pelas pessoas que regularmente adquirem o jornal ou se tem maior importância a publicidade bacoca que colam sobre esse texto e de forma tal que não dá sequer para descolar...”, escreve Joaquim Pinto.

Solicitei, portanto, um esclarecimento ao director.

“O Livro de Estilo do PÚBLICO dispõe, no seu ponto 118, que ‘a primeira e última páginas do 1º caderno só poderão incluir manchas publicitárias de canto ou rodapé, salvo circunstâncias ou contratos especiais’.
Apesar de escrito antes da remodelação gráfica, esta não só respeitou como reforçou estas limitações, designadamente ao passar o anúncio colocado por cima do logótipo para a parte inferior da capa do jornal.
Desde a remodelação gráfica esta foi a primeira vez que a direcção comercial propôs à direcção editorial um ‘contrato especial’ para um só dia.
Porquê? Porque, como nos explicou a direcção comercial, ‘este tipo de publicidade representa uma tendência enquadrada em formato inovadores de grande impacto que tem sido seguida pela generalidade dos jornais a nível internacional’, o que corresponde à verdade como eu mesmo tenho verificado enquanto leitor da imprensa internacional de referência (posso citar dezenas de exemplos). Mesmo assim esse exemplo internacional não seria suficiente se entendêssemos que constituía uma violação grosseira dos nossos princípios. Mesmo sendo o mercado publicitário cada vez mais competitivo e intrusivo, cabia saber se se enquadrava no ponto 112 do Livro de Estilo: ‘o PÚBLICO considera os seus anúncios como parte do conjunto de informações que os leitores procuram todos os dias nas suas páginas, mas não subordina o interesse jornalístico ao interesse publicitário de anunciantes ou afins’.
Neste caso isto foi feito com especial cuidado pois é a segunda vez que um anunciante utiliza a forma de autocolante para ganhar relevo na primeira página. Nessa primeira vez constatámos que a cola utilizada era muito forte e, em muitos casos, rasgava a capa do jornal. Por isso uma das condições que a direcção editorial colocou foi a utilização de uma cola mais fraca, semelhante à que noutros jornais não lhes rasga o papel. Uma segunda condição foi que a data de saída do anúncio fosse combinada para que, tendo o jornal de fechar mais cedo a edição, isso não prejudicasse o seu conteúdo informativo. Finalmente ficou combinado que, no próprio dia, com a primeira página já desenhada, se escolheria o melhor local para colocar o autocolante por forma a prejudicar o menos possível uma leitura global da capa. O director responsável pelo fecho recomendou então que fosse colocado em parte sobre o texto da manchete, em parte sobre a fotografia, localização que permitia a leitura de todos os títulos e comprometia menos a mancha gráfica, não havendo também qualquer possibilidade de confusão sobre tratar-se de um anúncio, algo que podia suceder se fosse colocado sobre o logótipo, conforme sugeriram alguns leitores.
Verificou-se que a cola, na maior parte dos exemplares, voltava a ser demasiado forte, facto de que pedimos desculpa aos leitores e pelo qual se penitenciaram as direcções comercial e de produção quando, mesmo antes de serem recebidos quaisquer protestos, as alertei para o que acontecera ao jornal que eu mesmo comprara. Fui informado que o próprio anunciante não tinha essa intenção, mas que o autocolante se soltasse facilmente.
A inclusão de publicidade como esta, ou noutras fórmulas com grande presença, na primeira página é, como recomenda o Livro de Estilo e como já foi por mais de uma vez debatido em Conselho de Redacção, uma excepção. Assim continuará a ser. Desta vez a cola utilizada em boa parte da edição era demasiado forte, motivo pelo qual só me resta pedir desculpa, em nome do jornal, a todos os leitores prejudicados”, respondeu José Manuel Fernandes.

As explicações estão dadas. Ocultar parcialmente a informação (‘manchetes’ e fotos) com anúncios é, portanto, uma opção que o PÚBLICO considera legítima e aceitável.
Nada mais a acrescentar.

domingo, maio 20, 2007 

HORA DE FECHO...

“Não sei a quem dirigir este e-mail. No entanto, tenho de escrever estas palavras de maior desencanto. Já remeti vários e-mails para o endereço ipsilon@publico.pt, mas não obtive qualquer resposta. O caso que seguidamente irei relatar não é inédito comigo. Os outros casos deixei passar em branco por falta de tempo ou por não ter deles conhecimento atempadamente.
No passado dia 11 de Maio de 2007, e como é habitual, comprei um exemplar do PÚBLICO, porque aprecio alguns artigos e redactores – alguns são meus amigos. Quando ainda na rua folheava, por acaso, o Ípsilon fico surpreendido com uma fotografia inserida na página 19, ilustrando um artigo de fundo com o título ‘O cantautor infame’ da autoria de Joana Amaral Cardoso.
Essa fotografia é-me muito familiar porque sou eu o autor dessa imagem. A fotografia que me refiro é do cantor Nuno Guerreiro. Chego a casa. Ligo o computador e entro na net. No ‘Google’ escrevo o link ‘NUNO GUERREIRO À CONVERSA COM JOAQUIM CARDOSO DIAS’ e imediatamente aparece a fotografia e a entrevista que realizei há alguns anos ao Nuno Guerreiro e que foi publicada no ‘Ensino Magazine’. A fotografia estava diferente, mas mesmo assim a reconheci. Fiquei magoado, ofendido, surpreendido... Nem sei exactamente explicar como me senti e como me sinto ao escrever este testemunho.
É lamentável e profundamente desonesto que um jornal como o PÚBLICO faça semelhante atentado aos direitos de autor de alguém que escreve, fotografa e publica livros como eu – mesmo que eu fosse alguém anónimo merecia o mesmo respeito e consideração. Mas se o furto em si mesmo dessa fotografia é grave – mais grave é ainda essa fotografia ter sido manipulada como que para disfarçar o roubo; para camuflar a apropriação, o furto, roubo de algo que não lhes pertence. Isso é verdadeiramente infame. Agiram com má fé. Comportaram-se com verdadeiros impostores. Apelidaram, no artigo, o George Michael de infame. Resta-me dizer que infames são os autores deste roubo – autora do texto e chefes de Redacção e sei lá mais quem. Já falei com amigos jornalistas e fotógrafos que me aconselharam a fazer um escândalo. Mas sou ponderado. Não gosto de ondas. Tento sempre procurar dias de mar calmo para navegar e fugir às tempestades que outros têm prazer em provocar.
Para concluir, acrescento que este lamentável acontecimento (devo confessar) me entristeceu e revoltou imenso. Nunca imaginei que o jornal PÚBLICO fosse capaz de tamanha safadeza.
Informo que se não tiver uma resposta pública e um pedido de desculpas formal que me satisfaça irei tomar providências judiciais. Não pensem, no entanto, que quero apenas uma nota de roda pé no fundo de uma qualquer página do jornal. Quem me conhece, sabe que sou um ser humano simples e alérgico a fogos de artifício. Mas semelhante roubo merece e exige outro tipo de tratamento para evitar ataques deste nível ao trabalho dos outros. Se não sabem a conduta que um jornalista deve ter, eu posso dar-lhes lições sobre esse tema. Ou então vão plantar batatas. Talvez seja esse o nível a que muitos jornalistas estão. Vivemos numa tempo assim. E infelizmente outros profissionais competentes estão no desemprego ou a plantar as batatas que vocês não estão a plantar. Enfim. Quem tiver ouvidos que oiça”, escreve Joaquim Cardoso Dias.

Os reparos são pertinentes.
Solicitei um esclarecimento ao editor do suplemento Ípsilon.

“Em hora de aperto, no fecho da edição, num motor de busca na Internet surgiu como solução rápida para uma última fotografia necessária. No caso, uma imagem de Nuno Guerreiro para ilustrar um texto secundário, uma ‘caixa’ (com o título ‘Nuno Guerreiro, fã devoto’) de um trabalho sobre o cantor George Michael. Sem ser essa a nossa intenção, acabámos por ferir os direitos do autor da foto, Joaquim Cardoso Dias. O Ípsilon errou (o que já reconhecemos na edição de sexta-feira, na secção ‘O PÚBLICO errou’).
Como só o texto da entrevista de Joaquim Cardoso Dias no site da ‘Ensino Magazine’ é assinado, e não tendo a certeza da autoria da foto, erradamente partimos do princípio de que se tratava de uma foto de promoção do cantor. Tínhamos obrigação de ser mais diligentes.
Quanto ao recorte da fotografia: o recorte das imagens faz parte do novo modelo gráfico, que pressupõe que fotos secundárias possam e devam ser recortadas – como se pode ver ao longo do suplemento (e do jornal) isto é uma regra. Não houve, por isso, nenhuma intenção de disfarçar a autoria da foto. O que não quer dizer que o autor não tenha razão ao sentir-se lesado nos seus direitos.
Já pedimos desculpas directamente a Joaquim Cardoso Dias pelo erro, afirmando que estamos disponíveis para pagar a utilização da referida imagem”, respondeu Vasco Câmara.

O provedor considera as explicações do editor inaceitáveis.

1- O editor justifica a ‘piratice’ com a “
hora de aperto” do “fecho da edição” e a procura de uma “solução rápida” para “ilustrar um texto secundário”.
O Ípsilon é um suplemento semanal. Era, portanto, desnecessário recorrer a ‘soluções rápidas’ (já que a foto era considerada, como reconhece o próprio editor, “
necessária”) que, por vezes, acabam por se revelar problemáticas.
A escassez de tempo não pode, por outro lado, servir de justificação para o ‘copianço’ de imagens na internet.


2- O editor afirma que não queria “ferir os direitos do autor da foto”, mas optou por feri-los ao copiar e publicar ilegitimamente a foto.
O provedor considera que o jornal devia ter contactado ‘Ensino Magazine’. Os números de telefone e de fax da revista podiam ser obtidos precisamente no site (http://www.rvj.pt/ensino/home.html) onde foi “copiada” a foto.
Em última análise teria sido mais correcto publicar o “
texto secundário” sem imagem.

3- O editor diz, por outro lado, que “
como só o texto da entrevista de Joaquim Cardoso Dias no site da ‘Ensino Magazine’ é assinado, e não tendo a certeza da autoria da foto, erradamente partimos do princípio de que se tratava de uma foto de promoção do cantor.
O PÚBLICO decidiu copiar e publicar uma imagem que lhe suscitava dúvidas. É uma opção curiosa.

4- O editor garante que não houve “
nenhuma intenção de disfarçar a autoria da foto”.
É muito provável que não tenha havido, mas Joaquim Cardoso Dias tem o direito de pensar o contrário. O PÚBLICO adulterou a sua fotografia (o monumento em pano de fundo foi transformado numa parede branca).
O facto de o PÚBLICO ter decretado um novo modelo gráfico (que na realidade só ao PÚBLICO diz respeito) não outorga ao jornal o direito de manipular ilegitimamente obras alheias.
5- O editor pretende que o PÚBLICO apresentou um pedido de desculpas a Joaquim Cardoso Dias, autor da fotografia.
É verdade, mas...
Joaquim Cardoso Dias contactou pela primeira vez o PÚBLICO no dia 11 (13h24), mas o jornal só lhe respondeu passados seis dias – depois de o provedor solicitar esclarecimentos ao suplemento Ípsilon.
E sucedeu exactamente o mesmo com a nota “O PÚBLICO Errou” (mencionada pelo editor). O jornal só publicou o referido texto um dia depois (18 de Maio, página 46) de o provedor ter pedido esclarecimentos ao Ípsilon.
Eis o texto em causa: “
No suplemento Ípsilon da semana passada foi usada erradamente uma fotografia do cantor Nuno Guerreiro da autoria de Joaquim Cardoso Dias, sem a sua autorização e assinatura. Ao autor as nossas desculpas, pois o erro foi cometido de forma involuntária por desconhecimento de que tratava de uma imagem de autor.

CONCLUSÃO
Os direitos de autor existem e devem ser respeitados, independentemente do suporte (internet incluída). É uma obrigação legal e é sobretudo um dever ético.
As justificações (pressão da hora de fecho, etc.) não podem e não devem servir de desculpa para tudo e mais alguma coisa.

domingo, maio 13, 2007 

FERNANDO PESSOA

O texto “A Coragem de Pessoa”, publicado (caderno P2, pág. 4) no passado dia 13 de Abril, não passou despercebido.
Escreve Laurinda Alves:
“Deixo aqui o texto inspirador de Fernando Pessoa que foi lido em voz alta neste fim de tarde inesquecível.

Posso ter defeitos, viver ansioso
e ficar irritado algumas vezes mas
não esqueço de que minha vida é a
maior empresa do mundo, e posso
evitar que ela vá à falência.
Ser feliz é reconhecer que vale
a pena viver apesar de todos os
desafios, incompreensões e períodos
de crise.
Ser feliz é deixar de ser vítima dos
problemas e se tornar um autor
da própria história. É atravessar
desertos fora de si, mas ser capaz de
encontrar um oásis no recôndito da
sua alma.
É agradecer a Deus a cada manhã
pelo milagre da vida.
Ser feliz é não ter medo dos próprios
sentimentos.
É saber falar de si mesmo.
É ter coragem para ouvir um “não”.
É ter segurança para receber uma
crítica, mesmo que injusta.
Pedras no caminho?
Guardo todas, um dia vou construir
um castelo…”

Alguns leitores questionam a autoria do “texto inspirador”.

“(...) Pretendo ser discreto e não quereria ofender a senhora jornalista, que transborda de boas intenções e a quem desejo (como à maior parte das pessoas…) que seja muito feliz assim — ainda que, em semelhantes circunstâncias, me ocorra, com insistência, um brevíssimo conto de Voltaire sobre espécies de felicidade… Mas tenho bastante dificuldade em imaginar que um tal acervo de banalidades, mesmo muito bem intencionadas e inspiradoras, alguma vez se tenha encontrado com a complexa intelectualidade de Pessoa, nem mesmo em momento de ternurenta elaboração de uma carta para a Ophélinha. Além de que, literariamente, o textinho é muito pobrezinho… e isso, nem nas cartas para a Ophélinha! Acresce ainda que é basto notória a genealogia brasileira do escrito, com formulações sintácticas que, se hoje desgraçadamente contaminam a escrita deste lado do Atlântico, no tempo de Pessoa não eram sequer usadas na outra margem do dito, ao menos nos meios literários…
Como é que ninguém se apercebe disto?!
Temo que, ao publicar o textinho, sem que ninguém notasse a incongruência, o ‘PÚBLICO’ lhe dê uma legitimidade inesperada (ainda se acredita no que vem nos jornais de referência), uma caução cultural reforçada, que sustente a convicção (sempre bem intencionada, com boa onda e muito karma) dos que continuam a não entender que a NET é um recurso muito importante, mas também muito perigoso, pois muito do que por ela viaja não tem qualquer validação…
Será que vou deparar com uma rectificação numa das próximas edições do ‘PÚBLICO’?
É claro que, se algum especialista em Fernando Pessoa me disser de que arca ou baú surgiu esta prosa, prometo que irei de burel e baraço em romagem ao Altar da Ignorância. E aceitarei, finalmente, como provado que o poeta uma ou outra vez abusaria do álcool e… não resistiria, mesmo assim, a escrever…
”, escreve Paulo Rato, um leitor de Queluz.

O texto suscitou mais interrogações.

É citado um poema pretensamente de Fernando Pessoa (‘A Coragem de Pessoa’, sem referência bibliográfica), cuja autenticidade me deixa dúvidas.
Uma frase como:
‘agradecer a Deus a cada manhã’ não me parece que tenha saído da caneta do Mestre. Mas admito estar totalmente enganada, pelo que muito grata ficaria se me fornecessem a referência específica: qual o heterónimo, qual a data, qual a ‘arca’ donde extraíram o poema”, escreve Fernanda Jesuíno.

A solicitação da leitora é legítima.

Já não é a primeira vez que me cruzo com esse texto (na altura foi-me enviado por e-mail), e já nessa altura tive a nítida impressão de que não é coisa que Pessoa fosse escrever. Não é estilo (ou estilos) dele. Não é o tema dele. Penso aliás que não é nada dele e o facto de o ver hoje preto no branco no PÚBLICO numa coluna de alguém que respeito e que a priori até confio saiba mais de Fernando Pessoa que eu, não me fez mudar de ideia.
No entanto, não encontro informação na net que me suporte. Até porque esse texto está reproduzido incontáveis vezes e sempre colado ao nome de Fernando Pessoa. Não tenho mais a quem recorrer, a não ser que escreva para a Casa Fernando Pessoa, coisa que já tive mais longe de fazer. A única coisa que encontrei foi na Wikipédia, mas isso vale o que vale. Fica aqui transcrito:
‘Pedras no caminho? Eu guardo todas. Um dia vou construir um castelo.’
Sentença tipicamente atribuída a Fernando Pessoa na internet, ainda que nunca tenha sido escrita por ele, e sim por Nemo Nox, bloguista brasileiro.
(http://pt.wikiquote.org/wiki/Fernando_Pessoa)
Confio no seu juízo para avaliar a pertinência do meu comentário
”, escreve Daniel Marinha (do blogue www.quotidianidades.blogspot.com).

O comentário é pertinente.

“Mundo Pessoa” (blogue institucional da Casa Fernando Pessoa) apresentou três dias depois o “post”Agarra que é apócrifo!”: “Leonor Areal, no (blogue) Doc Log chama a atenção para coisas que é importante ler esclarecidas.” (http://www.mundopessoa.blogspot.com/)
Eis o comentário de Leonor Areal: “(...) Laurinda Alves, em dia de azar, publica um texto supostamente de Fernando Pessoa, apócrifo evidentemente. Está à vista de qualquer um que conheça a obra de Pessoa que aquele poema piroso nunca podia ser dele, e ainda por cima com pronome reflexo colocado à moda brasileira: ‘Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e se tornar um autor da própria história’. Um idiota qualquer o escreveu, (...)”. (“Fernando Peçonha” in http://doc-log.blogspot.com/2007/04/fernando-peonha.html)

É muito provável que a prosa corresponda a dois textos de autores diferentes. O bloguista brasileiro Nox poderá ser um deles: “No início de 2003, chateado com os obstáculos que encontrava e tentando ser um pouco otimista, escrevi aqui estas três frases: ‘Pedras no caminho? Eu guardo todas. Um dia vou construir um castelo.’ Não pensei mais nisso até que recentemente comecei a receber e-mails pedindo que eu confirmasse ser o autor do trechinho. Aparentemente, o trio de frases tomou vida própria e se espalhou pela internet lusófona com variações na pontuação e na atribuição da autoria. (...) Depois alguém resolveu pegar um poema (possivelmente de Augusto Cury, autor de Dez Leis para Ser Feliz), colar o tal trechinho no fim e distribuir tudo como se fosse obra do Fernando Pessoa. Não demorou muito para que as minhas três frases começassem a pipocar pela rede atribuídas ao poeta português (afinal, é sempre mais bacana citar um famoso escritor luso que um quase desconhecido blogueiro brasileiro). Cheguei eu mesmo a duvidar da minha autoria. Poderia ter cometido um plágio inconsciente, recolhendo da memória alguma coisa lida no passado e achando que se tratava de material original? Revirei os poemas pessoanos em busca de pedras e castelos mas não consegui encontrar qualquer coisa remotamente parecida ao trecho em questão. Vasculhei os heterônimos e tampouco achei o guardador de pedras. (...) Outra coisa engraçada é que nem me sinto orgulhoso de ter escrito isso, parece-me hoje até um pouco piegas, como aqueles cartazes motivacionais com fotos bonitas e frases otimistas.” (in www.nemonox.com/ppp/archives/2006_03.html#008119)

O psiquiatra Augusto Cury (autor de “O Mestre do Amor”, “A Ditadura da Beleza” ou “O Futuro da Humanidade) não confirma a autoria da outra parte.

O provedor contactou, portanto, a Casa Fernando Pessoa.
“O poema em questão não é de Fernando Pessoa, coisa que poderia ser garantida à primeira leitura (pelo tema, pela escrita, pela ortografia). No Brasil, tanto na web como em papel impresso, circulam vários «poemas apócrifos» assinados por Fernando Pessoa; muitas vezes, os seus autores pretendem garantir algum reconhecimento anónimo através da utilização do nome do poeta – são, geralmente, textos de má qualidade e que, infelizmente, se multiplicam todos os dias. Qualquer «leitor mediano» da obra de Pessoa ou dos seus heterónimos se dá conta da mistificação e da falsificação. Fernando Pessoa não diz semelhantes patetices”, esclareceu Francisco José Viegas, escritor e director da Casa Fernando Pessoa.

Pedi, por outro lado, um esclarecimento a Laurinda Alves:
“Agradeço sinceramente o contributo dos leitores e dos especialistas para desfazer um equívoco que não era só meu e, por isso, podia ser perpetuado.
Aqui ficam os textos e as cartas, escritos em vários tons, a desfazer todas as dúvidas. Verifico, com surpresa, que ainda há pessoas que vivem convencidas de que nunca se enganam nem se deixam enganar.”

Laurinda Alves reconhece o erro.
O provedor considera que os jornalistas devem confirmar a veracidade da informação que divulgam. É uma forma de evitar enganar os outros. O resto é conversa...

domingo, maio 06, 2007 

MUDA O DISCO E TOCA O MESMO... (EPÍLOGO)

A PÉROLA
“Alertado pela minha filha de 10 anos recuperei esta Vossa pérola para um post no meu blogue: ‘este ano já morreram cerca de 50 mortos‘ no PÚBLICO de domingo (29 de Abril de 2007), Mundo, pág. 19.”, escreve Sérgio Pinto Ribeiro, um leitor bloguista (http://suckandsmile.blogspot.com/2007/04/do-jornalismo-de-referncia.html) da cidade do Porto.

O reparo é pertinente.
“Este ano morreram já cerca de 50 mortos” – sem comentários.
O PÚBLICO errou.

A CONFUSÃO

“No artigo ‘Equipa(s) da casa’ que Diana Ferreira escreveu na edição impressa (pag. 15) do PÚBLICO de 30 de Abril de 2007 pode ler-se na primeira frase: ‘Quem não acorreu ao Estádio do Bessa na noite de sábado, encontrou semelhante orgulho portista na Casa da Música. A razão é simples: a Orquestra Nacional do Porto (ONP) e o Coral de Letras - dois importantes símbolos para o público da cidade - contracenaram na Sala Suggia."A correcção é a seguinte: ‘orgulho PORTUENSE’ e não ‘orgulho portista’. Erro crasso e, para uma portuense, grave.A ONP e o Coral de Letras da UPorto em nada estão ligados ao clube de futebol FCP”, escreve Paula Brochado.

O reparo da leitora é pertinente.
Para o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea (Academia das Ciências):
1- “Portista”: diz respeito ou pertence ao Futebol Clube do Porto; é dirigente, jogador, adepto ou simpatizante desse clube desportivo.
Há, por outro lado, dicionários que não reconhecem a existência de “portista” (substantivo ou adjectivo);
2- “Portuense”: é da cidade do Porto ou dos seus habitantes, diz-lhes respeito; é natural ou habitante dessa cidade.
O PÚBLICO errou.

A GRANDE CONFUSÃO
“Que confusão!! Nos últimos tempos, como leitor relativamente atento, tenho vindo a notar cada vez mais pequenos ‘lapsos’ no PÚBLICO. Não sei o que está a suceder, mas é um passo para um bom jornal de referência se tornar medíocre e sem nível ao nível de muitos outros.Hoje (1 de Maio de 2007) ao ler o P2 um artigo com o título ‘Os homens ingleses gostavam de ler...’ deparei com várias incorrecções que denotam falhas graves de quem o escreveu e depois na sua revisão.A autora fala dos diferentes tipos de comportamento sexual na era ‘vitoriana’. Supõe-se que estamos localizados no tempo, no séc. XIX, já que a rainha Vitória reinou de 1837 a 1901! Erro crasso, pois a autora quer referir-se ao século XVIII, ou seja de 1701 a 1800. No entanto, insiste em chamar este século de ‘oitocentista’, talvez influenciada pelo número 8 romano! Obviamente, era setecentista o que lá deveria estar e vitoriano nunca poderia ser. No entanto aparece ‘há 300 anos’ várias vezes o que levaria a pensar aproximadamente em 1707.Perante estes dislates toda a credibilidade do artigo cai por terra! Os factos não parecem ser comprovados e existe uma enorme falta de cultura geral básica. Existe um facilitismo e simplificação excessiva que tem que ser combatido.Já nem menciono a pintura escolhida para ilustrar o artigo – ‘La maja desnuda’ de Goya (pintor espanhol), pintado entre 1797 e 1800, fim do século XVIII!! Não seria melhor escolher um pintor britânico desse século?”, escreve José Paulo Andrade, um leitor do Porto.

Os reparos são pertinentes.
O artigo de Andréia Azevedo Soares contém erros históricos, erros de português, e gralhas.
Eis mais dois exemplos:
1- ERRO: O apelido da investigadora é escrito de várias formas;
2- GRALHA (na introdução do texto!):
“litaratura”.

Solicitei esclarecimentos à jornalista.
“O leitor tem toda a razão. Usei erroneamente as palavras ‘vitoriano’ e ‘oitocentista’. O nome da autora Jenny Skipp também foi, por lapso, referido incorrectamente. Peço desculpa pelos erros”, respondeu Andréia Azevedo Soares.
Nada a acrescentar.
Conclusão do provedor: o artigo peca por falta de profissionalismo, mas a jornalista não é a única responsável. O editor leu o texto e deixou passar tudo...
O PÚBLICO errou.

A INCONSCIÊNCIA
“Na edição de hoje (1/Maio/2007), na página 12, li um artigo do Sr. José Bento Amaro que, entre outras coisas, dá as ‘receitas’ para o fabrico de ‘bombas caseiras’.Acho lamentável que se corra o risco de induzir os jovens a fabricar as ditas ‘bombas’.Gostava de saber a sua opinião sobre este assunto”, escreve Aníbal Marramaque Matos, um leitor do Porto.

Os reparos são deveras pertinentes.
Aquilo que está em causa é sobretudo a seguinte passagem:
“os engenhos utilizados são quase todos eles idênticos: uma garrafa plástica de litro e meio cheia com XXXX XXXX (XXXX), ao qual se adicionam depois fragmentos de XXXX. O simples contacto das duas substâncias é passível de originar uma reacção que culmina numa explosão de alguma violência, podendo as lesões ser causadas através do XXXX que é projectado ou através dos fragmentos de XXXX (também há casos em que são utilizadas bolas de XXXX deste XXXX).”

Solicitei, portanto, um esclarecimento ao Director do jornal.

“A passagem citada era desnecessária, pois neste caso concordo que é de evitar dar informações desse tipo. Tal como é desnecessário descrever como se faz um cocktail Molotov sempre que se cita a utilização de um”, respondeu José Manuel Fernandes.
O provedor discorda do Director: considero que “
não é de evitar dar”, mas recusar peremptoriamente publicitar nas páginas do jornal quaisquer informações precisas sobre a forma de produzir engenhos explosivos.
É informação irrelevante no plano jornalístico e pode revelar-se desastrosa (nos planos humano e material).
É verdade que esses dados circulam na internet, mas nada obriga o PÚBLICO a ser cúmplice.

O endereço electrónico do provedor é: provedor@publico.pt

POST-SCRIPTUM: “Quero felicitar-vos pela vossa luta pela liberdade de imprensa, não esquecendo colegas vossos, jornalistas do mundo, mortos em combate: com o vosso trabalho continuado de reportagens e artigos de opinião sobre esta matéria, todos eles continuam de alguma forma a contribuir para essa necessária e infindável luta. Acredito no poder da imprensa, num poder puramente cívico que procura, a través da disponibilização e da partilha da informação e do conhecimento, construir um dia-a-dia e um amanhã mais positivos para todos. A liberdade de imprensa nunca será um tema esgotado, e nunca será demais abordá-lo: conto com o PÚBLICO nesta linha da frente planetária”, escreveu a leitora Catarina Vilaça.
Nada a acrescentar.

quinta-feira, maio 03, 2007 

BLOGUE DE RUI ARAÚJO

Decidi criar um blogue: http://verborum.blogspot.com/index.html
É uma iniciativa exclusivamente pessoal, independente das minhas funções no PÚBLICO.
Para que conste...
Rui Araújo

Sobre o blog

  • O blogue do Provedor do Leitor do PÚBLICO foi criado para facilitar a expressão dos sentimentos e das opiniões dos leitores sobre o PÚBLICO e para alargar as formas de contacto com o Provedor.

    Este blogue não pretende substituir as cartas e os e-mails que constituem a base do trabalho do Provedor e que permitem um contacto mais pessoal, mas sim constituir um espaço de debate, aberto aos leitores. À Direcção do PÚBLICO e aos seus jornalistas em torno das questões levantadas pelo Provedor.

    Serão, aqui, publicados semanalmente os textos do Provedor do Leitor do PÚBLICO e espera-se que eles suscitem reacções. O Provedor não se pode comprometer a responder a todos os comentários nem a arbitrar todas as discussões que aqui tiverem lugar. Mas ele seguirá atentamente tudo o que for aqui publicado.

  • Consulte o CV de Rui Araújo

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Um blog do PUBLICO.PT