domingo, maio 28, 2006 

AUTORIA - SEGUNDA PARTE

Ontem, 6 de Maio, o PÚBLICO publicou no caderno Local de Lisboa (admito que noutros), uma notícia da jornalista Ana Fragoso com o título "Erro do ICN viabilizou parque eólico em Espanha".
A minha primeira perplexidade é a assinatura da notícia: é que a notícia transcreve um texto da agência noticiosa Lusa, disponível no PÚBLICO on-line desde sexta-feira às 9 e 47. Tenho no meu mail o texto original da Lusa e a diferença é apenas de organização dos parágrafos. É normal o PÚBLICO copiar textos de terceiros, não os referir e assinar como se fossem notícias suas?
A segunda perplexidade é o facto do público reproduzir um facto objectivamente falso sem contactar as pessoas envolvidas. Como do texto da notícia é evidente, foi o início das obras que motivou o alerta do Parque Natural de Montezinho. Tal significa que nesse momento o parque eólico estava já licenciado em Espanha. Logicamente não é o atraso no tratamento dessa informação de Montesinho que viabiliza o parque eólico. Há, portanto, um erro factual no título da notícia e em toda a sua construção. Esse erro é da Lusa, portanto enquanto leitor do PÚBLICO não é sobre esse erro que questiono o seu provedor, mas sobre os procedimentos adoptados no jornal para produzir notícias: é normal que o jornal transcreva notícias de terceiros sem a mínima verificação da sua correcção e autenticidade?
”, escreve Henrique Pereira dos Santos.

Solicitei uma explicação à jornalista Ana Fragoso sobre a omissão da fonte na assinatura já que a autoria de uma parte significativa do texto é da agência Lusa.

Começo por justificar que o título da notícia se baseou num texto da agência Lusa, que citava um dos responsáveis do ICN.
Efectivamente, não é prática dos jornalistas do PÚBLICO escreverem os seus textos sem contactar directamente as fontes e eu, por regra, também não o faço.
Neste caso concreto, tive conhecimento da situação pela agência Lusa, tentei localmente (Bragança) reunir as informações necessárias para compreender a questão e conseguir esclarecer os leitores. Por apertar o tempo para o fecho da edição, acabei por utilizar as informações da Lusa, na boa fé, e por considerar que se trata de uma agência de informação creditada, que trabalha com verdade e honestidade.
No texto que eu escrevi, as declarações transcritas da Lusa estão devidamente identificadas. Exemplo: "O erro foi da minha divisão. O erro foi meu!", declarou à agência Lusa Henrique Pereira dos Santos, chefe da divisão de apoio à gestão das áreas protegidas no ICN.
O texto foi assinado por mim com agência Lusa. Por razões que desconheço, acabou por ser publicado unicamente com a minha assinatura. Também não é norma cortar o nome da Lusa ou de outros jornalistas do próprio jornal, quando há textos escritos em conjunto”, respondeu a jornalista.

O provedor considera que a jornalista agiu correctamente ao assinar o texto com o seu nome e o da agência Lusa.
Se as assinaturas tivessem sido mencionadas tudo estaria dito. Ora, só o nome da jornalista foi publicado. Para o leitor que teve acesso à Lusa e leu a notícia no PÚBLICO, a usurpação da autoria parece evidente. Eis, por exemplo, os “leads” (primeiros parágrafos):

PÚBLICO: O arquivamento indevido de uma informação no Instituto de Conservação da Natureza (ICN) permitiu a instalação, sem avaliação ambiental, de um extenso parque eólico espanhol junto a uma área protegida de Bragança.

LUSA: O arquivamento indevido de uma informação no Instituto da Conservação da Natureza (ICN) permitiu a instalação de um extenso parque eólico espanhol junto a uma área protegida de Bragança sem avaliação ambiental, disse à Lusa fonte do INC.

A única diferença entre os dois textos é “disse à Lusa fonte do INC” ou seja, a opção da jornalista (que consistiu em identificar a fonte no final da notícia) acabou por ser escamoteada no PÚBLICO. Para o leitor o que conta é o que é publicado no jornal e não os quês e os porquês labirínticos que conduziram ao texto apresentado.

Pedi uma explicação a Nuno Sousa, o editor que retirou o nome da Lusa da assinatura.


1 – A ausência de uma referência à agência Lusa na assinatura do texto é um mero lapso, que muitas vezes deriva dos constrangimentos de fecho do jornal. Sempre que as peças jornalísticas são elaboradas por um jornalista do PÚBLICO com recurso a informações de agência, é regra assinar-se “com Lusa” (no caso) no final do texto, logo a seguir ao trinco. Acontece que, por vezes e inadvertidamente, essa última referência desaparece na etapa de fecho das páginas quando é necessário ajustar o tamanho do texto ao espaço disponível.
Lamentavelmente, o trabalho em causa, que para além dos esforços de investigação próprios se socorreu de informações prestadas pela agência Lusa, foi publicado somente com o nome da jornalista. Será relevante, porém, notar que as declarações extraídas do telex da Lusa estão perfeita e devidamente identificadas no texto - a expressão utilizada é “declarou à agência Lusa” Henrique Pereira dos Santos -, pelo que me parece não haver margem para dúvidas relativamente ao veículo dessa informação em particular.
2 – Como acontece com todos os trabalhos do Local Porto, o texto em causa foi atenta e integralmente revisto, tendo sido inclusive pedidas à jornalista algumas informações adicionais, por forma a clarificar os mecanismos de actuação dos estados-membros da União Europeia em matérias desta sensibilidade e a localizar com maior precisão o parque eólico em apreço. É prática corrente dos jornalistas do PÚBLICO confirmarem previamente todas as informações a publicar, mas o volume de trabalho diário e o cumprimento de horários de fecho levam a que, ocasionalmente, sejamos obrigados a confiar no serviço prestado pelas agências noticiosas. Embora seja esta a excepção e não a regra, não pode, contudo, ser ignorado o facto de, no momento em que escrevo e a avaliar pelos telexes colocados em linha, o ICN não ter desmentido as referidas declarações em sede própria, no caso a agência Lusa”, disse o editor.

O editor reconhece que se trata de um lapso. Errou, reconhece o erro, mas socorre-se da Lusa. É um exercício meritório no plano da dialéctica, mas no mínimo controverso a nível do jornalismo.
O provedor considera que o PÚBLICO não pode querer, por um lado, reivindicar para si uma notícia com o mérito que isso acarreta e, por outro, quando se verifica que os factos relatados são questionados sacudir a água do capote imputando a responsabilidade à Lusa ou a terceiros que se esqueceu de referir.

A jornalista (ao dizer “por apertar o tempo para o fecho da edição acabei por utilizar as informações da Lusa”) refugia-se na escassez de tempo e o editor (ao referir o volume de trabalho diário e o cumprimento de horários de fecho” e “é necessário ajustar o tamanho do texto ao espaço disponível) nas condições de trabalho e em circunstancialismos (o tempo e o espaço) que sempre marcaram esta profissão.
Como certamente se compreende não é missão do provedor pronunciar-se sobre isso, mas apenas sobre o resultado final da actividade dos jornalistas. O provedor é, primeiramente, uma ponte entre os jornalistas e os leitores.

domingo, maio 21, 2006 

AUTORIA - PRIMEIRA PARTE

Dois leitores escreveram ao provedor por causa de um problema ético grave: a reprodução de informação alheia sem atribuição exaustiva da fonte.

"Sr. provedor, um artigo da BBC News, escrito pelo sr. Gavin Esler, foi “traduzido” e publicado no jornal PÚBLICO no dia 10/04/2006 sob a assinatura de um jornalista.
Neste artigo, o sr. jornalista não menciona a fonte e limitou-se a fazer uma tradução literal desse artigo.
Na universidade, isso dá direito a nota 0 (zero).
Como leitor do PÚBLICO, gostaria de saber se Gavin Esler é o nome artístico deste senhor jornalista, ou se este sr. jornalista não fez o trabalho de casa
", escreve Victor Alves Gomes.

Como o rigor é importante, à semelhança da ironia, é preciso esclarecer o seguinte:
1 – O “sr. jornalista” é uma senhora jornalista. E é mais exactamente Francisca Gorjão Henriques.
2 – A data exacta da publicação é 09/04/2006 (e não 10/04/2006).
3 – A jornalista não fez “uma tradução literal” do artigo da BBC, recorreu à BBC e à revista norte-americana Foreign Affairs.
4 – A jornalista do PÚBLICO cometeu, apesar de tudo, alguns erros.

Reproduziu literalmente, por exemplo, o título da BBC (“Como os EUA perderam a América Latina...” – “How the US ‘lost’ Latin America”).

Solicitei um esclarecimento a Francisca Gorjão Henriques.

“O título baseia-se numa citação do analista que escreveu o artigo da BBC, devidamente identificada no meu texto. Como tal, considerei, assim como a minha editora, que a sua autoria ficava atribuída para quem lesse o conteúdo (o que duvido que o leitor tenha feito). O próprio título da BBC poderá ser inspirado no de outro artigo (que também vem citado amplamente no meu texto, mas não no da BBC) escrito por Peter Hakim para a Foreign Affairs de Janeiro-Fevereiro: ‘Is Washington losing Latin America?’.
Ao contrário do que diz o leitor, as referências ao artigo da BBC on-line estão sempre identificadas e devidamente citadas, ou seja, dentro de aspas. Só posso concluir que, ou o leitor não leu o artigo, ou está de má-fé. O meu texto baseou-se claramente no confronto dos pontos de vista de dois analistas, que foram sempre identificados e citados, do princípio ao fim”, explicou a jornalista.

A argumentação da jornalista não parece aceitável.

O título copiado é da BBC e o primeiro parágrafo do artigo está relacionado com a Foreign Affairs.

Francisca Gorjão Henriques não pode dizer “considerei” que a autoria do título “ficava atribuída para quem lesse o artigo”. Isso não é rigor, é feeling. É um sentimento, não é um critério jornalístico.

A jornalista também não tem razão quando refere que “o próprio título da BBC poderá ser inspirado no de outro artigo”. “Inspirado” é uma coisa (perfeitamente válida), “copiado” é outra. É uma opção incorrecta.
O argumento não colhe, portanto.


O provedor retém a seguinte afirmação da jornalista: “Ao contrário do que diz o leitor, as referências ao artigo da BBC on-line estão sempre identificadas e devidamente citadas, ou seja, dentro de aspas.”
O leitor pode não ter razão, mas a jornalista reproduziu, por exemplo, um parágrafo inteiro da revista “Foreign Affairs” sem colocar uma única aspa e sem mencionar a autoria do texto.

PÚBLICO: “Os Estados Unidos têm ainda assim um mercado considerável na região, com as exportações americanas a atingirem mais de 150 mil milhões de dólares por ano – quase tanto como o que exporta para a União Europeia.”

FOREIGN AFFAIRS: “The United States still has a big market in Latin America, with U.S. exports to the region valued at more than $150 billion a year, almost as much as the value of its exports to the European Union.”

O provedor considera que Francisca Gorjão Henriques assumiu indevidamente a autoria de parcelas de texto.

Eis a explicação da jornalista:
“Todo o meu artigo é construído à volta das duas análises, e apenas duas, sendo isso bastante claro ao longo do texto. Considero que a informação que estou a dar é atribuída ao autor do artigo da Foreign Affairs, Peter Hakim, já que a frase que lhe segue é claramente uma citação, bem identificada como tal: ‘Dois terços deste montante...’ Realço aqui a expressão ‘deste’, porque nos remete para a informação que a antecede. Mudei algumas palavras à frase de Hakim, ainda que poucas, já que se trata de uma informação factual e não de carácter opinativo, e por isso não coloquei as aspas nessa frase – que é antecedida por uma citação e seguida da conclusão de Hakim, que, repito, estão entre aspas. Julgo que não levanta quaisquer dúvidas sobre o facto de se tratar ainda de uma referência ao artigo da Foreign Affairs e que não reclama para mim a sua autoria.”

O que é claro para Francisca Gorjão Henriques não é necessariamente óbvio para os leitores.

O provedor defende que o texto reproduzido pela jornalista do PÚBLICO devia estar entre aspas e indicar a fonte.

A única alteração introduzida (substituiu “Latin America” por “região”) é irrelevante e não pode servir de justificação para omitir as aspas e a paternidade do texto.

Fica, designadamente, por explicar o facto de a jornalista ter sistematicamente citado as fontes e não o ter feito neste caso. O provedor não entende…

Para além das maiores ou menores responsabilidades individuais de Francisca Gorjão Henriques, há constrangimentos relacionados com a produção do jornal e em particular com os procedimentos em vigor no PÚBLICO que podem influenciar decisivamente a produção deste tipo de erros.

Por limitações de espaço, o provedor só desenvolverá o tema na sua próxima crónica depois de analisar um segundo texto posto em causa. ■

domingo, maio 14, 2006 

GUERRAS

Há três anos atrás o director do PÚBLICO apoiou a invasão do Iraque baseado em informações falsas (mentiras). Existiam na altura relatórios feitos por peritos independentes (Hans Blix) que demonstravam que o Iraque não constituía um perigo para a Humanidade, porém o director do PÚBLICO preferiu ignorá-los e tomar como verdadeiro aquilo que era falso. Dessa forma manipulou a verdade, distorceu os factos e enganou os leitores.
Senti-me na altura (decerto como muitos leitores) ultrajado e indignado por o “o meu jornal” apoiar um crime contra a Humanidade recorrendo à mentira.
Três anos depois, o director do PÚBLICO, ao invés de assumir o erro e fazer um mea culpa, prefere a fuga em frente, continuando a defender o indefensável e a escrever coisas inacreditáveis como “o mundo e o Iraque estão melhores”.
Um país destruído e em guerra civil, carnificinas diárias, adesões em massa ao terrorismo, a ameaça de uma nova guerra mundial... − e perante este cenário arrepiante o director do PÚBLICO escreve candidamente que o mundo está melhor...
É demais! É insulto aos leitores, os quais são tratados como idiotas e acéfalos.
Perante tamanho desplante do director, deixo aqui o meu veemente protesto Sr. Provedor Rui Araújo
, escreve João Cerqueira de Viana do Castelo.

Os reparos do leitor são legítimos.
Solicitei um esclarecimento ao director.

“O PÚBLICO não apoiou ou deixou de apoiar a intervenção no Iraque. A posição editorial do jornal foi claramente expressa numa nota da Direcção Editorial publicada em Março de 2003 onde se escrevia, designadamente, que ‘como é sua tradição, o PÚBLICO não toma posição na crise iraquiana. Isso não impede que surjam posições claras nos editoriais que, assinados por um embro da direcção, reflectem a sua opinião individual. Essa opinião, ou opiniões, não condicionam nem a busca de objectividade e a exigência de rigor na informação, nem o pluralismo das opiniões e pontos de vista’”.
“O director do PÚBLICO apoiou a intervenção, explicou porquê e regressou ao tema no terceiro aniversário da intervenção. É um facto que tenho e tive opinião (vivo num país livre, trabalho num jornal livre e plural), não é um facto que tenha manipulado ou distorcido factos para enganar os leitores: fiz e faço leituras diferentes dos factos que as deste leitor”.
“Não é um facto que Hans Blix tivesse demonstrado que o Iraque não constituía um perigo para a Humanidade. É um facto que disse que não descobrira armas de destruição maciça (que ele próprio admitia existirem) tendo pedido mais tempo para saber se o Iraque constituía ou não um perigo para a Humanidade”.
“Poderia discutir as opiniões do leitor sobre o Iraque e o Mundo, como ele discute as minhas. Mas são opiniões, e neste jornal elas são livres. Antes, durante e depois daquela guerra. Por serem livres, plurais e contrastantes é que valorizam a inteligência dos leitores, que podem formar a sua opinião de forma não acéfala”, respondeu José Manuel Fernandes.

É uma opinião e o provedor não comenta opiniões.
O facto de não me pronunciar não significa que aprovo a posição adoptada pelo director, revela apenas que não tenho competência para o fazer. É o que determina o estatuto.


Numa altura em que está por dias a inclusão na agenda ministerial, para discussão, duma nova (?) política que, conforme já anunciado, não será mais que um prolongamento da anterior (“foi eficaz e permanece actual” no dizer do presidente do IDT - Instituto da Droga e da Toxicodependência) e, como tal, não irá fazer mais senão reassegurar o último lugar no ranking europeu, já há algum tempo pertença de Portugal no que concerne à prevalência do consumo de drogas, parece à Associação para um Portugal Livre de Drogas (APLD), que esta é a altura oportuna para relançar na sociedade portuguesa a discussão desta sempre tão premente como presente questão.
Para o efeito, parece a esta Associação que, como ponto de partida, seria oportuna a divulgação do relatório de Dezembro de 2004 do INA - Instituto Nacional de Administração, que avaliou a ENLCD - Estratégia Nacional de Luta contra a Droga, seguida no nosso país entre 1999 e 2004 e que, por motivos que escapam a esta Associação, não foi ainda devidamente publicitado.
Sendo uma realidade, como cita aquele relatório assinado por uma equipa de técnicos dirigidos pelo Prof. Valadares Tavares, que naquele intervalo de tempo se assistiu a um "desesperante agravamento da situação no que concerne à procura, à oferta e à reinserção social”, parece então urgente, não só tentar entender os motivos que levam os nossos governantes a insistir numa estratégia tão desoladoramente perdedora, como encetar quanto antes uma discussão aberta na sociedade portuguesa dos pressupostos de mudança a serem obrigatoriamente introduzidos, em ordem a reverter tão sombrio quadro
, propõe Manuel Pinto Coelho, presidente da direcção da APLD.

A proposta do leitor é razoável.
Pedi um esclarecimento a Catarina Gomes, a jornalista que tem escrito sobre esta matéria.


“A nova estratégia de luta contra a droga está há algum tempo para ser aprovada, assim que houver novas nesta frente o PÚBLICO fará disso notícia. Já se escreveu, no entanto, sobre a aprovação da estratégia europeia de luta contra a Sida, que servirá também de base ao documento português”.
“A cobertura da área da droga não se limita à vertente institucional e bem recentemente fez-se um trabalho sobre as novas tendências de consumo de droga em ambiente de dança e de problemas havidos na anterior direcção do Instituto da Droga e da Toxicodependência”.
“Quanto ao relatório de 2004, a que alude o leitor, ele foi devidamente divulgado - e com destaque - na altura da sua divulgação em conferência de imprensa, tendo-se dado nota das falhas e virtudes da estratégia anterior”.
“Em antecipação da actual estratégia foi uma notícia feita (da minha autoria) em que o actual presidente do Instituto da Droga e Toxicodependência antecipou as linhas mestras desta nova estratégia”.
“Numa notícia, com chamada à primeira página, falou-se das duas principais metas: os toxicodependentes deverão poder passar a ser atendidos em centros de saúde e vai haver afinamentos na lei de descriminalização do consumo de droga”, disse a jornalista.

A explicação de Catarina Gomes é aceitável.
Ficamos, portanto, à espera do anúncio da nova estratégia que irá privilegiar a redução de danos ou a prevenção e o tratamento, opções opostas, mas que mereciam um debate público.

domingo, maio 07, 2006 

MUDAM-SE OS TEMPOS…

O jornal PÚBLICO, que é dos únicos jornais que ainda se podem ler, tem vindo a desapontar numa área que é crucial. Falo da ortografia, que tem vindo a ser descurada pelos senhores jornalistas nos últimos tempos. Julgo ser fácil apontar os motivos que a fazem uma área crucial. Simplesmente o jornal é uma publicação impressa ou “digital” mas que é lida e para além de ter um papel informativo tem também um papel educativo.
Portanto, penso que os jornalistas ou quem quer que esteja responsável pela redacção dos artigos devia ser mais responsável nesta área.
Tenho visto erros até em cabeçalhos de notícias, o que para mim é inconcebível.
N sou maniako da ortografia m axo q nalgumas coisas ha q ter atencao e fazer por fazer bem. Xau ai e coiso e tal... hasta :),
conclui Fred Lixo.

O leitor cibernauta tem razão, apesar do último parágrafo.

Sou um fiel leitor do PÚBLICO desde a primeira hora e é com grande pesar que noto que esse jornal voltou a ser atacado pelo vírus dos erros ortográficos e gramaticais.
Há uns anos, durante uns tempos, foi frequente e entristecedor a quantidade de erros ortográficos que esse jornal apresentava, depois o problema (quase) desapareceu. Agora voltou a atacar.

Reporto exemplos recentes:
Da edição de 3 de Abril, página 9, vinha escrito “enchame” (em vez de “enxame”) duas vezes, uma em destaque e a seguir mais abaixo no texto do artigo.
Dessa mesma edição aparecia “pião” (em vez de peão).
Da edição de ontem, página 66 do caderno LOCAL, lia-se em título “Em Odivelas ajuda-se os mais carenciados lavando-lhes a roupa” quando a partícula apassivante se obriga à concordância da pessoa verbal pelo que se deveria dizer “Em Odivelas ajudam-se os mais carenciados...”
Com todas as ajudas de correctores automáticos postas à disposição de quem tem por missão escrever, os erros ortográficos e gramaticais tornam-se ainda mais grosseiros e desrespeitadores para com o público leitor.
Espero que esta seja uma doença passageira porque eu gostaria de continuar a ter orgulho em ser leitor desse jornal
, escreve Fernando Lemos de Caxias.

O provedor só pode concordar com as afirmações do leitor.

Gostava de sugerir-lhe, se assim o entender, que fizesse chegar à redacção os comentários dos leitores sobre questões de Língua Portuguesa.
Não há dia que passe sem que eu veja corroborada a minha tese, digamos, sobre o mais recente uso do verbo “suportar” na nossa língua. É muito inglês para quem disso pouco sabe. Há um enorme défice de formação contínua na Língua Portuguesa no seio de uma profissão que dela se serve como principal instrumento de trabalho.
Por outro lado, num mundo que fala cada vez mais em Inglês, é de bom senso elementar promover competências de tradução junto dos e das jornalistas. Se calhar é pedir muito.
Talvez assim se evitasse a repetição de erros como, por exemplo, “reescrever”.
Na edição de 30 de Março, podemos ler o seguinte título (citação) na página 16: “O país já não suporta Benjamin Netanyahu”.
Só com extraordinária dose de complacência podemos aceitar ler, na sequência da derrota do Likud, que o “país” deixou de apoiar a pessoa em causa. O que está escrito nesse título, em primeiríssimo lugar, é que o “país” já não o pode ver nem morto. Já não está para o aturar, quer vê-lo pelas costas, etc., etc.
Assim como, nos jornais, toda a gente “acredita”, agora tudo é para “suportar” ou é "suportado”. Confesso que é preciso paciência. Para suportar tal coisa, claro,
escreve Fernando Gonçalves da Praia da Tocha.

Mais um reparo pertinente.

Continua a chocar-me que a maioria da imprensa escrita e a quase totalidade da imprensa falada se mostre incapaz de distinguir os chamados verbos abundantes daqueles que o não são. Erro frequentíssimo que reflecte esta ignorância é o de utilizar “morto” como único particípio passado do verbo “matar”.
Neste aspecto não erra o PÚBLICO mais do que outros jornais, rádios ou televisões. Mas a sua responsabilidade como jornal de referência deve fazer dele o primeiro alvo desta crítica. Assim, como mero exemplo desse erro quase omnipresente, cito o artigo de Carolina Reis sobre a libertação dos presos de Peniche, na edição de 2 de Abril. Diz a autora que três dos presos “tinham morto um delator”. Mais adiante fala do assalto ao Santa Maria, “onde tinha sido morto um tripulante da PIDE”.
A autora errou no primeiro caso e acertou no segundo. Para a voz activa, o particípio de “matar” é “matado”, e portanto devia ter dito que os três presos “tinham matado um delator”. Para a voz passiva, o particípio é “morto”, portanto fez bem em dizer que o PIDE do Santa Maria “tinha sido morto”,
propõe Elsa Sertório de Lisboa.

A leitora tem razão.

São cada vez mais habituais os erros ortográficos nos jornais e não só...
No PÚBLICO de dia 6 de Abril aparece escrito “de mais”, quando deveria ter sido escrito “demais”, já que o significado é equivalente a “demasiado” ou “demasiadamente”.
Como este é um erro recorrente e comum à maioria da população, não ficaria mal ao PÚBLICO dar algum destaque pedagógico/didáctico ao assunto. A menos que agora, nesta cultura de massas, já só interesse mesmo o conteúdo, desvalorizando-se a forma...,
afirma Luís Leite de Lisboa.

É óbvio.
Pedi um esclarecimento ao director do PÚBLICO.

“Idealmente não deveriam existir erros de português, mesmo considerando que por vezes há formulações que alguns leitores consideram erradas mas que já são aceites por linguistas. Noutros casos há polémica sobre a melhor construção (sucede muitas vezes com as concordâncias). Contudo há erros indiscutíveis que se mantêm teimosamente. A explicação é simples: erro humano. Se nenhum programa informático detecta todas as gralhas, muito menos os erros de português. A sua ocorrência deriva quer de lapsos, quer de cortes mal executados, quer também de ignorância pura e dura. Antigamente os jornais possuíam uma bateria de revisores, mas tal era no tempo em que o jornalista escrevia à mão ou na máquina de escrever e estes dedicavam-se sobretudo a ‘catar’ gralhas. Com os computadores o texto do jornalista pode ir directamente para página. A regra no PÚBLICO é que não vá, devendo passar antes pela revisão/edição do responsável da secção e, depois, quando possível, pela equipa de copy-desks. Estes, contudo, têm responsabilidades mais alargadas do que os antigos revisores – podem intervir na construção das frases, por exemplo, ou mesmo sugerir alterações mais profundas – mas a equipa que temos no jornal não consegue ver todos os textos. Mesmo assim, apesar destas três redes (jornalista, editor, desk) há demasiados erros que escapam.
Pessoalmente não sinto que o jornal tenha hoje muito mais erros de português do que no passado. O que pode suceder é que a rotação normal das equipas faça com que os jornalistas que escrevem com menos qualidade possam estar em secções mais lidas numa certa altura, o inverso podendo ocorrer noutros momentos. No caso concreto dos erros de português não atribuo a responsabilidade à diminuição do número total de desks, até porque ocorreram muitas melhorias no fluxo das notícias e melhorias informáticas que hoje permitem que se cometam à partida menos erros do que no passado. Ainda há dias tive de consultar edições antigas e assustei-me com alguns dos erros que encontrei. E se caminhar-nos ainda mais para trás, para os anos 80 e para os anos 70 (antes do PÚBLICO), penso que não é prosápia afirmar que na maior parte das publicações havia então muito menos cuidado do que hoje. Mas também a exigência dos leitores era menor – e ainda bem que hoje é maior.
Exigir sempre mais e mais rigor. A alternativa – reforçar a equipa de desks – não nos parece ser, face ao equilíbrio geral dos nossos recursos, a aposta correcta. O que se deve exigir é que o jornalista comece por escrever correctamente e o editor por rever correctamente. Para além disso há algumas rotinas de verificação informática que estão a ser criadas e que são mais perfeitas do que as actuais a detectar erros de construção gramatical. Vai ajudar, mas não resolve tudo. Em última análise a qualidade dos textos depende do talento e rigor de quem
os escreve”, respondeu José Manuel Fernandes.

Os jornalistas cometem erros de palmatória que fariam empalidecer os alunos de uma 4ª classe do antigamente.
José Manuel Fernandes não sente que o jornal tenha mais erros de português, mas alguns leitores pensam o contrário.
O provedor, por falta de outros e melhores instrumentos científicos, vê-se, portanto, obrigado a acreditar no “palpitómetro”, um sistema de aferição inventado pelos portugueses.

Os erros de português não são um problema exclusivo do PÚBLICO, são (infelizmente) um sinal dos tempos. E dos jornalistas que temos…

Sobre o blog

  • O blogue do Provedor do Leitor do PÚBLICO foi criado para facilitar a expressão dos sentimentos e das opiniões dos leitores sobre o PÚBLICO e para alargar as formas de contacto com o Provedor.

    Este blogue não pretende substituir as cartas e os e-mails que constituem a base do trabalho do Provedor e que permitem um contacto mais pessoal, mas sim constituir um espaço de debate, aberto aos leitores. À Direcção do PÚBLICO e aos seus jornalistas em torno das questões levantadas pelo Provedor.

    Serão, aqui, publicados semanalmente os textos do Provedor do Leitor do PÚBLICO e espera-se que eles suscitem reacções. O Provedor não se pode comprometer a responder a todos os comentários nem a arbitrar todas as discussões que aqui tiverem lugar. Mas ele seguirá atentamente tudo o que for aqui publicado.

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