“PORMAIORES”, INFORMAÇÃO E PUBLICIDADE
“Se me interessasse pelo sensacionalismo e a manipulação dos factos, teria muito por onde escolher. Mas acontece que sou leitor (e assinante) do PÚBLICO, que pretende ser reconhecido como um jornal de referência.
Agora que deu por concluídas as suas crónicas acerca de ‘pormenores’, permita que me refira a ‘pormaiores’. Escolho dois, de entre muitos que de forma preocupante proliferam no PÚBLICO.
Todos sabemos o efeito dos títulos, assim como sabemos quantos leitores ‘se ficam’ pelos títulos, nomeadamente os das primeiras páginas.
Na edição de 20 de Julho de 2006, na página 2, em título, podemos ler ‘REGIME PARA TRANSFERÊNCIA DE FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS APROVADO COM ABSTENÇÃO DA DIREITA’. Assim se consegue ludibriar os ‘leitores de títulos’, que são muitos! Porque é que o título da ‘notícia’ não refere quais as forças políticas que votam contra? A quem interessará este título mentiroso?
Na primeira página da edição de 22 de Julho de 2006, em título, podemos ler ‘GOVERNO DIMINUI PENALIZAÇÃO PARA REFORMAS ANTECIPADAS’ e na página 40 da mesma edição deparamo-nos (subtilmente?) com ‘GOVERNO DIMINUI PENALIZAÇÃO PREVISTA PARA REFORMAS ANTECIPADAS’! Muitos leitores leram o título da primeira página e poucos terão lido o título da página 40...
A verdade é que o Governo pretende que as reformas antecipadas passem a ser mais penalizadas! A quem interessa esta confusão de intenções?
‘Hoje, o principal problema do jornalismo é a erosão progressiva da qualidade (provocada, designadamente, por opções editoriais controversas e influências económicas subtis, mas perniciosas). O desafio é, portanto, recuperar a credibilidade (...).O resto são pormenores, podem ser importantes, mas não deixam de ser pormenores...’ escreveu o provedor do PÚBLICO na sua crónica de 6 de Agosto de 2006.
E os ‘pormaiores’, senhor provedor, até quando vão continuar à mercê de ‘influências económicas subtis’? Ou de influências de outra natureza, quem sabe, ainda mais preocupantes?”, indaga Orlando Ponte.
Muitas vezes aquilo que está em causa é apenas a ignorância e a falta de profissionalismo.
Solicitei um esclarecimento ao director do PÚBLICO.
“Sobre o primeiro título (‘REGIME PARA TRANSFERÊNCIA DE FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS APROVADO COM ABSTENÇÃO DA DIREITA’): A dúvida antes do debate era como votariam o PSD e o CDS, pois os outros partidos já tinham anunciado que votariam contra. A notícia era o que não se sabia antes, por isso a opção de, nesse caso, se ter destacado abstenção da direita. O título não é ‘mentiroso’, apenas escolhe sublinhar uma parte do que se passou, pela sua novidade.
Sobre o outro título, o da primeira página (‘GOVERNO DIMINUI PENALIZAÇÃO PARA REFORMAS ANTECIPADAS’) é menos completo, mas seguindo a lógica do leitor, o do interior (‘GOVERNO DIMINUI PENALIZAÇÃO PREVISTA PARA REFORMAS ANTECIPADAS’) também não é completo, pois implica que o leitor sabe a que se refere o termo ‘previstas’.
O problema dos títulos é dizerem em poucas palavras o que às vezes exige mais palavras. A opção do PÚBLICO aquando da última revisão do grafismo foi encontrar fórmulas que permitissem que os títulos pudessem ter mais palavras, para serem mais explicativos, logo mais completos. Isso nem sempre é possível, mas quem quer que soubesse o que estava em causa — uma proposta governamental amplamente divulgada de revisão em alta da penalização por antecipação da reforma — compreenderia tanto o primeiro como o segundo título, não sendo induzido em erro por nenhum deles.
Se estes títulos pecam por alguma coisa não é pois por procurarem enganar o leitor, mas por partirem do princípio que o leitor tem conhecimento do que está em causa, que seguia ambas as discussões e por isso compreenderia a opção de quem os fez sem mais explicações. Esse erro é frequente no jornalismo português em geral e também ocorre no PÚBLICO, apesar de a recente revisão do Livro de Estilo identificar claramente que todas as notícias devem ser enquadradas.
Em suma: os dois títulos não tiveram a intenção de manipular, não ‘protegiam’ ninguém nem visavam defender qualquer interesse particular, económico ou político”, respondeu José Manuel Fernandes.
José Manuel Fernandes reconhece apesar de tudo a existência de um erro.
A explicação do director é aceitável.
O próprio Livro de Estilo estipula, aliás, que “as notícias do PÚBLICO são sempre apresentadas com títulos descritivos suficientemente claros para que o leitor os entenda”, mas isso nem sempre sucede.
Os jornalistas não podem presumir que os leitores já sabem tudo ou não sabem nada, ambas as opções são incorrectas. “Clareza, simplicidade e precisão” devem continuar a ser as “características básicas do estilo do PÚBLICO”.
“Depois de ter lido uma série de jornais ‘PÚBLICO’ seguidos, reparei que durante a realização da Volvo Ocean Race 2005 — 2006 que quase sempre que existia uma notícia sobre esta competição existia na mesma página uma publicidade à Volvo (que não se verificava nos outros dias). Não conhecendo o que diz o ‘Livro de Estilo’ do PÚBLICO face a esta perigosa ligação entre publicidade e jornalismo (perigosa pois colocam-se múltiplas questões: haveria notícia se não existisse publicidade? Será ético aceitá-la?) gostava de saber a sua posição face à mesma, e, antes ainda, se a questão é pertinente.
Devo acrescentar que se for necessário, poderei indicar-lhe múltiplas datas em que tal acontece, ou, se preferir, um intervalo temporal em que este facto acontece continuadamente”, indaga Frederico Silva.
As perguntas são legítimas. E, decididamente, pertinentes e actuais.
Pedi uma explicação ao editor do Desporto.
“Em resposta à questão levantada pelo leitor, é verdade que as notícias relacionadas com a Volvo Ocean Race foram sempre acompanhadas de suporte publicitário, uma vez que o anunciante quis associar-se à publicação de noticiário sobre o evento.
No que se refere ao demais noticiário da vela, recordo que o PÚBLICO acompanha, desde o seu início, os principais eventos internacionais da modalidade. Só para referir este ano, uma leitura mais atenta permitiria encontrar noticiário tão diverso como a regata solitária de Ricardo Diniz até Dakar, as regatas da Louis Vuiton Challenge (12 dos Actos preliminares da Taça América, o novo recorde do francês Bruno Peyron na travessia do Atlântico Norte, a regata em solitário Les Sables d'Olonne — Açores — Les Sables d'Olonne. Recuando um pouco, mas não muito, encontraremos no PÚBLICO a Regata Sydney-Hobart, a Rolex Fasten Race, a Portugal Match-race, o último recorde da navegadora solitária Ellen McArthur, a Oryx Quest (nova rota de regata transoceânica asiática), a Vendée Globe, entre outras. A cobertura de vela olímpica em Atenas, Sydney, Atlanta e Barcelona, a Whitbred Race, são outras das grandes coberturas do PÚBLICO, realizadas por uma jornalista especializada em assuntos náuticos e com obra publicada”, respondeu Carlos Filipe.
A pretensão do anunciante é legítima, mas os jornais e o jornalismo obedecem a regras e legislação específicas.
De acordo com a alínea 123 do Livro de Estilo do PÚBLICO "deve evitar-se a inserção de publicidade a objectos ou acontecimentos nas mesmas áreas do jornal em que esses objectos ou acontecimentos forem tratados pela Redacção".
A regra é discutível (apesar de o provedor entender o espírito que animou a sua elaboração), mas é a que existe.
O provedor considera que a publicidade da Volvo não devia, portanto, ter sido inserida nas páginas que noticiavam a regata Volvo Ocean Race.
Excluo, por outro lado, a hipótese de a publicidade estar na origem da cobertura de um acontecimento. Como já escrevi, aqui, o jornalismo serve para informar. A publicidade e a propaganda comercial servem para convencer. A mistura destes géneros chama-se promiscuidade. E a credibilidade do PÚBLICO não tem preço.
PS- “Solicito ao senhor provedor do PÚBLICO, Rui Araújo, que publicite o seu endereço electrónico”, escreve José Raimundo Correia de Almeida.
Eis o endereço: provedor@publico.pt
Agora que deu por concluídas as suas crónicas acerca de ‘pormenores’, permita que me refira a ‘pormaiores’. Escolho dois, de entre muitos que de forma preocupante proliferam no PÚBLICO.
Todos sabemos o efeito dos títulos, assim como sabemos quantos leitores ‘se ficam’ pelos títulos, nomeadamente os das primeiras páginas.
Na edição de 20 de Julho de 2006, na página 2, em título, podemos ler ‘REGIME PARA TRANSFERÊNCIA DE FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS APROVADO COM ABSTENÇÃO DA DIREITA’. Assim se consegue ludibriar os ‘leitores de títulos’, que são muitos! Porque é que o título da ‘notícia’ não refere quais as forças políticas que votam contra? A quem interessará este título mentiroso?
Na primeira página da edição de 22 de Julho de 2006, em título, podemos ler ‘GOVERNO DIMINUI PENALIZAÇÃO PARA REFORMAS ANTECIPADAS’ e na página 40 da mesma edição deparamo-nos (subtilmente?) com ‘GOVERNO DIMINUI PENALIZAÇÃO PREVISTA PARA REFORMAS ANTECIPADAS’! Muitos leitores leram o título da primeira página e poucos terão lido o título da página 40...
A verdade é que o Governo pretende que as reformas antecipadas passem a ser mais penalizadas! A quem interessa esta confusão de intenções?
‘Hoje, o principal problema do jornalismo é a erosão progressiva da qualidade (provocada, designadamente, por opções editoriais controversas e influências económicas subtis, mas perniciosas). O desafio é, portanto, recuperar a credibilidade (...).O resto são pormenores, podem ser importantes, mas não deixam de ser pormenores...’ escreveu o provedor do PÚBLICO na sua crónica de 6 de Agosto de 2006.
E os ‘pormaiores’, senhor provedor, até quando vão continuar à mercê de ‘influências económicas subtis’? Ou de influências de outra natureza, quem sabe, ainda mais preocupantes?”, indaga Orlando Ponte.
Muitas vezes aquilo que está em causa é apenas a ignorância e a falta de profissionalismo.
Solicitei um esclarecimento ao director do PÚBLICO.
“Sobre o primeiro título (‘REGIME PARA TRANSFERÊNCIA DE FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS APROVADO COM ABSTENÇÃO DA DIREITA’): A dúvida antes do debate era como votariam o PSD e o CDS, pois os outros partidos já tinham anunciado que votariam contra. A notícia era o que não se sabia antes, por isso a opção de, nesse caso, se ter destacado abstenção da direita. O título não é ‘mentiroso’, apenas escolhe sublinhar uma parte do que se passou, pela sua novidade.
Sobre o outro título, o da primeira página (‘GOVERNO DIMINUI PENALIZAÇÃO PARA REFORMAS ANTECIPADAS’) é menos completo, mas seguindo a lógica do leitor, o do interior (‘GOVERNO DIMINUI PENALIZAÇÃO PREVISTA PARA REFORMAS ANTECIPADAS’) também não é completo, pois implica que o leitor sabe a que se refere o termo ‘previstas’.
O problema dos títulos é dizerem em poucas palavras o que às vezes exige mais palavras. A opção do PÚBLICO aquando da última revisão do grafismo foi encontrar fórmulas que permitissem que os títulos pudessem ter mais palavras, para serem mais explicativos, logo mais completos. Isso nem sempre é possível, mas quem quer que soubesse o que estava em causa — uma proposta governamental amplamente divulgada de revisão em alta da penalização por antecipação da reforma — compreenderia tanto o primeiro como o segundo título, não sendo induzido em erro por nenhum deles.
Se estes títulos pecam por alguma coisa não é pois por procurarem enganar o leitor, mas por partirem do princípio que o leitor tem conhecimento do que está em causa, que seguia ambas as discussões e por isso compreenderia a opção de quem os fez sem mais explicações. Esse erro é frequente no jornalismo português em geral e também ocorre no PÚBLICO, apesar de a recente revisão do Livro de Estilo identificar claramente que todas as notícias devem ser enquadradas.
Em suma: os dois títulos não tiveram a intenção de manipular, não ‘protegiam’ ninguém nem visavam defender qualquer interesse particular, económico ou político”, respondeu José Manuel Fernandes.
José Manuel Fernandes reconhece apesar de tudo a existência de um erro.
A explicação do director é aceitável.
O próprio Livro de Estilo estipula, aliás, que “as notícias do PÚBLICO são sempre apresentadas com títulos descritivos suficientemente claros para que o leitor os entenda”, mas isso nem sempre sucede.
Os jornalistas não podem presumir que os leitores já sabem tudo ou não sabem nada, ambas as opções são incorrectas. “Clareza, simplicidade e precisão” devem continuar a ser as “características básicas do estilo do PÚBLICO”.
“Depois de ter lido uma série de jornais ‘PÚBLICO’ seguidos, reparei que durante a realização da Volvo Ocean Race 2005 — 2006 que quase sempre que existia uma notícia sobre esta competição existia na mesma página uma publicidade à Volvo (que não se verificava nos outros dias). Não conhecendo o que diz o ‘Livro de Estilo’ do PÚBLICO face a esta perigosa ligação entre publicidade e jornalismo (perigosa pois colocam-se múltiplas questões: haveria notícia se não existisse publicidade? Será ético aceitá-la?) gostava de saber a sua posição face à mesma, e, antes ainda, se a questão é pertinente.
Devo acrescentar que se for necessário, poderei indicar-lhe múltiplas datas em que tal acontece, ou, se preferir, um intervalo temporal em que este facto acontece continuadamente”, indaga Frederico Silva.
As perguntas são legítimas. E, decididamente, pertinentes e actuais.
Pedi uma explicação ao editor do Desporto.
“Em resposta à questão levantada pelo leitor, é verdade que as notícias relacionadas com a Volvo Ocean Race foram sempre acompanhadas de suporte publicitário, uma vez que o anunciante quis associar-se à publicação de noticiário sobre o evento.
No que se refere ao demais noticiário da vela, recordo que o PÚBLICO acompanha, desde o seu início, os principais eventos internacionais da modalidade. Só para referir este ano, uma leitura mais atenta permitiria encontrar noticiário tão diverso como a regata solitária de Ricardo Diniz até Dakar, as regatas da Louis Vuiton Challenge (12 dos Actos preliminares da Taça América, o novo recorde do francês Bruno Peyron na travessia do Atlântico Norte, a regata em solitário Les Sables d'Olonne — Açores — Les Sables d'Olonne. Recuando um pouco, mas não muito, encontraremos no PÚBLICO a Regata Sydney-Hobart, a Rolex Fasten Race, a Portugal Match-race, o último recorde da navegadora solitária Ellen McArthur, a Oryx Quest (nova rota de regata transoceânica asiática), a Vendée Globe, entre outras. A cobertura de vela olímpica em Atenas, Sydney, Atlanta e Barcelona, a Whitbred Race, são outras das grandes coberturas do PÚBLICO, realizadas por uma jornalista especializada em assuntos náuticos e com obra publicada”, respondeu Carlos Filipe.
A pretensão do anunciante é legítima, mas os jornais e o jornalismo obedecem a regras e legislação específicas.
De acordo com a alínea 123 do Livro de Estilo do PÚBLICO "deve evitar-se a inserção de publicidade a objectos ou acontecimentos nas mesmas áreas do jornal em que esses objectos ou acontecimentos forem tratados pela Redacção".
A regra é discutível (apesar de o provedor entender o espírito que animou a sua elaboração), mas é a que existe.
O provedor considera que a publicidade da Volvo não devia, portanto, ter sido inserida nas páginas que noticiavam a regata Volvo Ocean Race.
Excluo, por outro lado, a hipótese de a publicidade estar na origem da cobertura de um acontecimento. Como já escrevi, aqui, o jornalismo serve para informar. A publicidade e a propaganda comercial servem para convencer. A mistura destes géneros chama-se promiscuidade. E a credibilidade do PÚBLICO não tem preço.
PS- “Solicito ao senhor provedor do PÚBLICO, Rui Araújo, que publicite o seu endereço electrónico”, escreve José Raimundo Correia de Almeida.
Eis o endereço: provedor@publico.pt